06 março 2015

O ALTAR, O ALTAR, O ALTAR...

O Velho Testamento está repleto de
relatos de conflitos entre povos
Os antigos livros da bíblia, que compõem o chamado “velho testamento”, estão repletos de histórias de combate e escaramuças de exércitos, ressaltando glórias de generais hebreus e filisteus, convocação de voluntários para a guerra e prejuízos causados pelos embates. Basta que se dê uma atenção mais redobrada em alguns trechos, como este do Livro de I Samuel, capítulo 17, versículos 12 e 13, para comprovar: “Davi, filho do velho Jessé, membro da tribo de Judá, tinha sete irmãos mais velhos do que ele. Os três primeiros – Eliabe, Abinadabe e Samá já se haviam apresentado como voluntários do exército de Saul para combater os filisteus”. Outro trecho ainda, do Livro de Reis II, capítulo 6, versículos 24 e 25, destaca o ataque de um determinado rei e suas consequências: “Algum tempo depois, Bem-Hadade, rei da Síria, mobilizou todo seu exército e cercou Samaria. O cerco durou tanto e causou tamanha fome que uma cabeça de jumento chegou a valer oitenta peças de prata, e uma caneca de esterco de pomba, cinco peças de prata”.
A IURD está recrutando jovens para os
"Gladiadores do Altar"

Analisar estes relatos bíblicos e entende-los dentro do contexto da época em que ocorreram é importante, pois certamente estão excluídos da realidade atual. Todavia, uma grande quantidade de pseudo pastores de inúmeras seitas pentecostais, sem qualquer formação teológica, tem se servido deles na tentativa de arregimentar fiéis para seus rebanhos. Utilizando uma forma anacrônica de resgatar versículos do velho testamento, procuram convencer os mais incautos e sequiosos de uma palavra de esperança, que há um combate diário e constante contra o mal, contra o pecado, contra o demônio, contra o infiel, contra tudo e contra todos que não aceitam os dogmas da religião. E muitas vezes, os da sua religião.

Pois esta semana, alguns vídeos na rede de computadores trouxeram preocupação por uma mistura extremamente perigosa de fanatismo religioso e organização militar. Misturando palavras de ordem, continência e orações, centenas de jovens marchavam frente a um líder religioso que os incitava a bradar cada vez mais alto. E a assistência, comovida com a performance efusiva dos “gladiadores do altar”, aplaudia e delirava.
Em Porto  Alegre os encontros se dão no Parque da Redenção 

Num momento em que se envidam esforços internacionais para tentar resolver o impasse de um grupo terrorista que mistura a religião e poder de estado, impressiona surgirem por aqui iniciativas similares àquelas que originaram o aterrador “Estado Islâmico”. Da mesma forma que o fascismo e nazismo recrutaram jovens muitas vezes ociosos para suas fileiras no século passado, e a Ação Integralista Brasileira de Plínio Salgado, extinta pelo Estado Novo de Getúlio Vargas em 1937, uma entidade religiosa bastante conhecida, com representatividade expressiva inclusive no Congresso Nacional, estados e municípios, se arvora em criar um determinado exército de jovens gladiadores.
O projeto da Igreja Universal recruta centenas de jovens em todo o Brasil, inclusive em outros países, onde a instituição possui representação. Aqui em Porto Alegre, os “gladiadores” possuem aulas de instrução militar, marchando e bradando gritos de guerra em pleno Parque da Redenção. Para o deputado Jean Wyllis, que solicitou ao Ministério Público uma atenção mais redobrada, “os soldados estão sendo treinados e formados para servir ao altar, e o proposito não está claro”. [Veja o vídeo]

Veja como ocorre a apresentação dos Gladiadores do Altar nos templos da IURD

Na minha opinião, as entidades religiosas já possuem na nossa constituição um amparo expressivo, na deliberação de liberdade de atuação, isenção de impostos e propagação de suas propostas. Os bens de uma entidade religiosa não constam em nenhuma declaração de imposto de renda de pessoa física. Eles pertencem à igreja. Portanto, as riquezas adquiridas pelas doações dos fiéis são incorporadas ao patrimônio da igreja, mas são desfrutadas pelas suas lideranças. Por isso, muitos deles possuem motorista particular, moram em verdadeiras mansões e se deslocam de jatinho como artistas famosos, sem necessitar fornecer explicações àqueles que os financiam.  
Particularmente, quando morei em Brasília, tive um embate com uma igreja pentecostal e seu pastor, o que me deixou bastante temeroso. Sofri, eu e minha família, ameaças por ter reclamado às autoridades públicas do barulho dos cultos que prejudicava o condomínio onde morávamos. Eram cinco cultos diários, de segunda a segunda, com aplausos e brados em voz alta de expulsão de demônios.
Deputado pede a interferência do Ministério Público

No caso dos “gladiadores do altar”, digo-lhes que também já fui jovem e entendo esta empolgação juvenil, que inadvertidamente pode ser utilizada em prol de questões escusas. Basta que se observe o grande contingente de jovens europeus que está se alinhando ao Estado Islâmico, apesar do incansável apelo dos pais. É sabido que o jovem muitas vezes assume responsabilidades para as quais não está preparado, pois possui características biológicas facilmente percebidas, como a distração, a inquietude, a impulsividade e a tendência ao tédio. De acordo com o Manual de Acidentes de Trabalho Fatais no RS, da Superintendencia Regional do Trabalho e Emprego local, “responsabilidade” é um atributo que depende fundamentalmente da capacidade de abstração, de forma que possam ser avaliadas as consequências futuras de nossos atos (ou seja, de consultar o futuro). As estruturas cerebrais que nos permitem realizar abstrações passam por grande desenvolvimento no período de adolescência, mas só atingem a maturidade na idade adulta.
Por isso, defendo a proposta do deputado Wyllis, sobre a necessidade de se investigar os objetivos deste exército de gladiadores, que a mim também impressionou já na primeira vez que assisti ao vídeo. Para que mais tarde não necessitemos realizar operações de resgate destes jovens influenciados, bem como, chorar por atitudes inconsequentes de um fanatismo religioso misturado com organização paramilitar, como já vimos acontecer inúmeras vezes.        

4 comentários:

Michele S Gomes da Rosa disse...

A qual batalha estão sendo recrutados? O que se refere ao inferno que precisa de força bruta para vencer.? Realmente necessitamos de olhares vigilantes.

Attico CHASSOT disse...

Meu caro colega de blogares Jairo,
nesta primeira semana de março, li surpreso a noticia acerca dos Gladiadores do Altar. Quase fiz-me incréu. Ou vi como exagero da imprensa que usualmente ‘não gosta das igrejas neopentecostais. Neste sábado faço minha leitura diário de teu blogue. Também tens ressaibos contra os pastores dessas igrejas.
Fazes central os Gladiadores do Altar. Matas a cobra e mostras o pau. Surpreendo-me. Primeiro pela maneira como mostras com textos bíblicos como o assim chamado ‘povo de Deus’ era um povo belicoso e guerreiro em nome do “Senhor dos Exércitos”. Depois trazes dados sobre o grupo paramilitar dos Gladiadores do Altar. É algo impressionante. O vídeo chega ser assustador.
Quando desejo cumprimentar-te por esta edição de teu blogue por concorrer com a imprensa com a vibrante atualidade desta notícia, fazes uma hermenêutica dos chamados textos sagrados. Permito-me aditar três versículos do capítulo 10 do livro de Josué:
12 No dia em que o Senhor entregou os amorreus aos israelitas, Josué exclamou ao Senhor, na presença de Israel:
"Sol, pare sobre Gibeom!
E você, ó lua, sobre o vale de Aijalom!"
13 O sol parou,
e a lua se deteve,
até a nação vingar-se
dos seus inimigos,
como está escrito no Livro de Jasar.
O sol parou no meio do céu e por quase um dia inteiro não se pôs.
14 Nunca antes nem depois houve um dia como aquele, quando o Senhor atendeu a um homem. Sem dúvida o Senhor lutava por Israel!
Este relato, extraído de textos ditos sagrados, ratifica a tua tese da belicosidade dos israelitas mas serviu, há muito, não apenas para ratificar posturas geocêntricas (O sol parou para não fazer-se noite e sim continuarem guerreando e matando) mas foi motivo para que muitos fossem considerados condenados. Giordano Bruno foi a fogueira, também por defender o heliocentrismo.
Parabéns pela oportunidade em denunciares os Gladiadores do Altar.

Prof. Jairo Brasil disse...

Mestre Chassot
ë deploravel e condenavel a atitude destas seitas, que se servem das fragilidades humanas para encher seus templos e também aquinhoar doações que fazem exuberantes as riquezas ostentadas por seus líderes.JB

Prof. Jairo Brasil disse...

Querida Michele...
Realmente estar atento a tudo isso e utilizar também a sala de aula como instrumento de esclarecimento dos menos informados. Creio que esse também seja o nosso papel. Obrigado pela tua presença e comentário aqui.JB