PMDB, o partido das eternas alianças |
Minha esposa me qualifica
de vez em quando: “Mas tu é muito pretensioso!”. Começo a acreditar que sou mesmo,
principalmente pela indignação que me acomete e não consigo me calar diante de
coisas estapafúrdias e de tamanho mau caráter. Talvez por isso, hoje me atrevi
a uma aulinha de política, só prá explicar como surgiu uma coisa que essa gente
miúda e de pouca idade talvez desconheça, e que eu ao longo dessas minhas quase
seis décadas de existência vi brotar e criar raízes, se espalhando como um câncer
no sistema político brasileiro. É sobre um partido chamado PMDB.
A origem verdadeira deste
partido é extremamente nobre, talvez nem mereça os “salafras” que atualmente
compõem suas hostes. Ele surgiu durante o governo militar para dar uma falsa
impressão ao restante do mundo de que aqui no Brasil, embora a ditadura
estivesse instalada, havia representação partidária. Portanto, naquela época
existiam somente dois deles, a ARENA (Aliança Renovadora Nacional), que de
renovadora nada tinha, e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro),
representando uma oposição esquálida e praticamente fantasmagórica, já que pouca
representatividade possuía.
A verdadeira origem da maioria dos atuais partidos |
Na medida em que as amarras
da ditadura foram se soltando, o MDB original deu lugar ao PMDB, congregando
uma grande parcela dos opositores do regime e aprimorando sua atuação como
representante da oposição. Pode-se dizer ainda que dali surgiram outras
legendas bem conhecidas na atualidade, inclusive o próprio PSDB. Também a ARENA
foi embrião de outros partidos hoje bem conhecidos, como o DEM (Democratas) e o
PDS (Partido Democrático Social).
Mas uma coisa marca a
trajetória deste partido, para quem pouco conhecimento tem de seu histórico; o
PMDB nunca participou de um processo democrático de escolha para presidente.
Sua única participação foi quando por via indireta, através dos votos do
congresso nacional, elegeu Tancredo Neves em janeiro de 1985, colocando um
ponto final no regime militar. Mesmo assim, não foi empossado, deixando este
encargo ao seu vice de chapa, José Sarney, que foi o mais incompetente da
história republicana, sendo os anos 90 considerada a “década perdida”.
José Sarney, senador pela ARENA durante a ditadura, presidente pelo PMDB na década de 1990 |
Terminada a “década
perdida”, como ficou conhecida a Era Sarney, de lá para cá o PMDB assumiu papel
de “eterno coadjuvante”, sempre atuando nos bastidores a reboque dos outros
partidos. Mas não que disso deixasse de tirar partido e proveito. Aliás, o que
mais fez nestes vinte cinco anos depois de desembarcar da cadeira presidencial foi
se especializar nisso. Tornou-se especialista em tudo aquilo que é do mais
baixo nível na política, tal como acordos, barganhas, conchavos, alianças,
conspirações.
Possui sim representantes
em esferas municipal e estadual; mas em Brasília convive sempre nas sombras,
interferindo, atrapalhando, influenciando quando necessário; mas nunca
assumindo papel de protagonista, papel de autor ou de criador. O PMDB que eu
conheço, e nem preciso atiçar minha imaginação, é como um verme que se esconde
nas entranhas do organismo político nacional, e que de maneira imperceptível e
sorrateira vai dilacerando o tecido putrefato das instituições e seus
representantes. Quando menos se espera, o tubérculo põe para fora cabeça e tentáculos,
em arrotos satisfeitos com o banquete digerido, e se mostra ávido por uma vítima
nova que lhe proporcione sobrevida.
Na aprovação do Impeachment de Collor, lá estava o PMDB apoiando todo o processo e se dispondo a novas alianças |
Foi assim na derrocada de
Collor, quando protagonizou na presidência das casas legislativas nosso
primeiro impeachment. Vibrou e comemorou com toda a nação a passagem do bastão
para o vice Itamar Franco, e cedo lá já estava para compor a coalisão do novo
governo. Depois, com a eleição de FHC, se aliou rapidamente ao PSDB, sempre na
expectativa de acomodar seus “cupinchas” sem perda de tempo. E assim ficou até
os minutos derradeiros do segundo mandato, quando prevendo uma virada “lulista”,
de pronto estava disponível ao novo soberano como uma prostituta se oferecendo a preço de ocasião. E abrindo os botões do decote foi logo exibindo seus dotes e
predicados, ansiosa e eufórica por mais uma farra de quatro anos. E assim foi,
e muito mais. Usou e se lambuzou das benesses do primeiro governo petista, que a ele se rendeu
incondicionalmente em busca de apoio, mas não se contentou. Tão logo o PT
conseguiu se perpetuar, estreando a primeira representante feminina, lá estava
o PMDB “balançando o rabinho” a mostrar que continuava dócil, desde que sua
“camarilha” se mantivesse à frente dos principais ministérios e gerindo as
maiores empresas públicas. Aliás, como sempre foi sua maneira de participar das
administrações federais.
Agora que a crise bate à porta do governo petista, outra vez o PMDB procura se reposicionar |
Pois agora, quando a crise bate
à porta do país e o comando da nação dá mostras de fraquejar, o PMDB em peso
começa novamente a se posicionar para não perder oportunidades. Como
excepcional mercenário, o comandante mor e atual vice Michel Temer, que compôs a chapa presidencial para
garantir o partido como coadjuvante no poder, agora se rebela e ameaça cuspir
no prato que comeu. Na verdade, expõe as garras porque pressente que é
novamente chegada a hora de se reposicionar diante do caos geral que assombra o
país.
O PMDB sempre foi assim e dificilmente
mudará sua postura. A negociata e o oportunismo estão no seu DNA. Um partido de
elementos que para sua legenda acorrem no intuito de defender não os interesses
de seus eleitores, mas os interesses próprios ou dos lobbys que os patrocinam
na expectativa do retorno imediato. Pior que as demais legendas, ele dificilmente se posiciona na "esquerda" ou "direita". Seu lado é sempre aquele que mais convém no momento oportuno. Tenho a impressão de que nem ao ocaso de minha
existência terei o prazer de vê-lo soçobrar ou ser engolido por uma nova representação
partidária, mais justa e mais honesta. É um sonho que infelizmente acalentarei talvez para o resto de meus anos.
Um comentário:
Meu caro Jairo,
realmente o MDB, antípoda da Arena, no qual votávamos e oferecia guarida às esquerdas, nada tem a ver com este PMDB que está bem analisado por ti.
O pior é que PT não resistiu. Fez alianças espúrias. Estas começaram em 2002 com a escolha do vice de Lula. Então o PT perdeu a virgindade. A porta foi escancarada. Hoje, a situação é lamentável.
Cumprimentos pela trazida histórica do cenário político brasileiro contemporâneo. Ontem pela manhã visitei o Memorial de Tancredo Neves (mestrechassot.blogspot.com de 12/12/2015) revivi um pouco do que descreves.
Com admiração,
attico chassot
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