A música faz parte da minha vida há muitos anos |
Quem me conhece sabe o quanto sou aficionado pela
música. Tenho pouquíssimo preconceito em relação a ritmos. Gosto de quase
todos, com preferencia de alguns que me fazem aguçar a audição toda vez que os
escuto. Admiro muito a música de raiz nativista, a sertaneja autêntica, os
grandes cantores e cantoras românticas, orquestras e conjuntos, duplas, trios e
vocais, algumas músicas eruditas e outros clássicos latinos. Confesso algumas aversões
que tenho por ritmos que não me fazem bem ao ouvido, como o “funck”, “lambada”,
alguns “pagodes” e outros cujas letras e sons acredito em nada contribuem para
meu crescimento intelectual, bem como, não conseguem catalisar meu pensamento
ao ouvi-los.
Humboldt, na província de Entre Rios, onde Ramon conheceu Merceditas |
Todos nós temos fases da vida que deixam fortes lembranças,
sejam elas negativas ou positivas. E destas lembranças a música parece
rememorar grandes momentos de nossas vidas. E uma destas marcas foi meu contato
com a língua espanhola, quando comecei a aprender as primeiras letras de música
latina.
Mas uma música que permeia minha vivencia com a língua
espanhola, e certamente muita gente admira e gosta de ouvir, é “Merceditas”. Tenho dúvida até hoje em relação à autenticidade do nome, pois alguns chamam Mercedita e outros adicionam um "s" ao final. A composição (letra e música) é
de autoria de Ramon Sixto Rios, e tem uma história interessante por detrás,
como toda a canção que nasce de uma grande inspiração e se perpetua como essa.
Segundo o autor, nascido em Federacion, chegara ele
com um grupo de teatro em 1939 na cidade Humboldt, província de Entre Rios, próximo a Rosário, para uma
turnê. Ambas cidades estão localizadas no vizinho país argentino. Foi quando conheceu uma bela camponesa, de olhos azuis, filha de
imigrantes alemães, que se chamava Mercedes Strickler Khalov, e que todos na
comunidade chamavam “Mercedita”. Havia perdido o pai muito cedo, e teve de
assumir a pousada juntamente com a mãe e a irmã.
Monumento na cidade de Federación, em homenagem a Ramon Sixto Rios |
No dia da apresentação da peça teatral, no Clube
Sarmiento, Ramon notou a presença de Mercedes, que usava um vestido branco e possuía
cabelos longos e encaracolados. “Mercedita” atraia a atenção não somente por
sua beleza, mas também pela maneira de se comportar, com um espírito
independente, bastante incomum para as mulheres da época, segundo Ramon. Foi
isso que o cativou desde o início.
Como ele morava em Buenos Aires, a mais de quinhentos quilômetros,
iniciaram um relacionamento que durou mais de dois anos, onde trocaram cartas e
ele a visitou seguidamente no município de Humboldt. Neste período Ramon
escreveu em sua homenagem o poema “Pastora
de flores”:
Allá en los campos solitarios
vive la Pastorcita,
la encantada Mercedita
que es leyenda entre las flores
que su mano ha cultivado.
Ella es la rubia mía,
y todo el mundo lo sabe;
lleva en sus manos un ramo
de bellas flores silvestres
y al verla así es que parece
que son las flores sus manos
o que su manos florecen.
vive la Pastorcita,
la encantada Mercedita
que es leyenda entre las flores
que su mano ha cultivado.
Ella es la rubia mía,
y todo el mundo lo sabe;
lleva en sus manos un ramo
de bellas flores silvestres
y al verla así es que parece
que son las flores sus manos
o que su manos florecen.
Ramon Sixto Rios |
No ano de 1941, Ramon propôs
casar-se com “Mercedita” e inesperadamente teve sua proposta rejeitada. Embora
a decepção de Ramon, a intenção de Mercedes era preservar o sentimento que
havia iniciado desde o primeiro encontro. Portanto, continuaram escrevendo
cartas um ao outro e Ramon resolveu compor a canção que se tornaria uma das
mais notáveis do cancioneiro popular argentino.
A Argentina vivia um
momento de renascimento da música folclórica, e seus ritmos se tornaram cada
vez mais populares no contexto de grandes mudanças sócio econômicas,
caracterizadas por um amplo processo de industrialização no centro de Buenos
Aires, o que provocou uma onda de migração interna a partir de 1930, das áreas rurais
para as urbanas, das províncias do interior para a capital.
Ramon Rios continuou
sua vida e se casou com outra mulher, e que o deixou viúvo apenas dois anos
depois. Em 1980, uma revista de Buenos Aires publicou uma entrevista com “Mercedita”.
Rios tomando conhecimento, escreveu-lhe uma carta pedindo para que viesse à
capital, quando ele voltou a propor-lhe casamento. Mas ela se recusou
novamente. Mantiveram-se mesmo assim, em contato estreito até a morte de Rios
em dezembro de 1994, quando tinha 81 anos. Ela viveu até os 84 anos e morreu
sem deixar filhos em 08 de julho de 2001.
A seguir, a letra da canção
que inspirou Ramon Sixto Rios e que até hoje é capaz de inspirar muitos corações
apaixonados, dentre eles o meu também.
Para quem prefere ouvir:
Um comentário:
Muito estimado Jairo,
redijo este comentário ouvindo Merceditas.
Nunca havia falar nada do que trazes na blogada deste semana.
Obrigado por trazer-me esta história.
A admiração do
achassot
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