02 abril 2008

DECISÃO HISTÓRICA EM FAVOR DO MEIO AMBIENTE

Por Dionísio Carvalho*

A Bunge tem mais de 100 anos no Brasil e a decisão é considerada histórica para a preservação do meio ambiente do Piauí e do Brasil.Foi publicado sexta-feira (dia 28/03/08) o acórdão proferido pela 5ª Turma do TRF 1ª. Região, em Brasília, que suspende imediatamente a utilização da lenha nativa do Cerrado do Piauí pela multinacional americana, Bunge Alimentos, instalada no município de Uruçuí.

A decisão atende ao pedido formalizado pela Fundação Águas do Piauí – Funaguas, através de uma Apelação Cível, recurso este recorrido de uma decisão do Juizado Federal do Piauí. A desembargadora Selene Maria de Almeida, relatora do processo em seu voto afirma: “Pelo exposto, dou provimento à apelação para anular a sentença prolatada desconstituindo o Termo de Ajustamento de Conduta efetivado pelas partes à revelia da apelante e determinando a suspensão na utilização de lenha pela empresa Bunge Alimentos S/A, unidade de Uruçuí, como matriz energética. Determino, ainda, o retorno da ação à vara de origem para que se dê continuidade ao processamento do feito, inclusive com a realização de perícia sobre os danos ambientais e prolação de sentença de mérito. É como voto”.

A Bunge implantou-se no Piauí em 2002 com o propósito de desenvolver o Estado, explorando o agronegócio da soja, adotando o discurso ideológico da “última fronteira agrícola do País”. No seu projeto havia dentre as muitas reivindicações a serem concedidas pelo Poder Público, a maior, que contemplava a empresa com isenção de 100% de impostos, por 15 (quinze anos) sobre a soja, farelo, óleos e em todos os produtos fabricados.Este benefício teria por objetivo dar competitividade para a empresa durante sua implantação, bem como nos anos que se seguiam. Ocorre que durante a implantação, a empresa não cumpriu requisitos básicos exigidos pela lei, como o EIA-Rima (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório). O estudo não passou de um arremedo de copiar-colar dos estudos inconsistentes que já existiam no Piauí há anos. O que foi parcialmente elaborado, além de não abranger detalhamento da utilização da lenha como matriz energética, sequer cumpriu o rito de aprovação em Audiência Pública do empreendimento, como a Lei prevê. Estes vícios segundo a Funaguas aconteceram devido à fragilidade do Estado do Piauí, carente de desenvolvimento, e vulnerável as pressões condicionantes imposta pela empresa para se instalar. O Estado assim, capitulou, cedendo e até mesmo concedendo excessivas facilidades, até hoje questionadas. Nesta situação, a Funaguas rebelou-se contra os itens que contrariavam a legislação em vigor e os que causavam danos irreparáveis ao Piauí. Organizou o Encontro Ocupar com Sustentabilidade, na cidade de Uruçuí, para discutir a questão. Convidou o Prof. Doutor Álvaro Fernando de Almeida da ESALQ/USP, que após o encontro deu parecer desfavorável ao EIA/Rima e ao modo como a Bunge estava se instalando no Piauí. Este parecer serviu de base para os Ministérios Públicos e a Funaguas ajuizarem a ACP. A Fundação depois ingressou como Litisconsorte Ativo, e posteriormente, logo após o TAC tornou-se a única na continuidade da Ação Civil Pública contra a Bunge, nos seguintes itens:

1. O EIA/Rima teve sua credibilidade posta em dúvida, no momento da descoberta de que foi elaborado com a participação da esposa do funcionário do IBAMA que forneceu o laudo de disponibilidade de lenha nativa para a queima em caldeiras;

2. Não aconteceu Audiência Pública para aprovação do projeto em face da perda de prazo do Ministério Público Estadual, faltando, assim, a transparência que a lei obrigava.

3. A viabilidade da utilização de lenha nativa como matriz energética, ter sido baseada no laudo do citado funcionário do Ibama, que apresentava farta disponibilidade deste material.Bunge - 100 anos utilizando lenha nativa do Cerrado.

Entretanto, o mais grave foi descoberto no decorrer do processo e objeto de pedido de abertura de Inquérito Civil Público. Descobriu-se através de documentos anexados pela própria Bunge que – supõe-se - mais de 80% das Guias Florestais utilizadas para legalizar sua lenha era “frias” ou de localidades onde não acontecia plantio de soja, como Luiz Correia no litoral do Piauí, região de manguezais, a 850 quilômetros da fábrica. Neste caso, ainda não apurado, o menor crime cometido pode ser o de ter ultrapassado o limite máximo de 30 quilômetros autorizados para o corte de lenha pelo Ibama (Ofício 164/2003 – DITEC/IBAMA-PI) e o maior, o de estelionato e contrabando.

A situação atual demonstra que a Bunge não gerou os empregos prometidos, em torno de 50 diretos, não ampliou a estrutura de esmagamento, não montou a fábrica de óleos refinados, margarina e rações balanceadas compromissadas no Projeto de Incentivos, e, por 5 (cinco) anos queimou lenha, pretendendo continuar, utilizando-se do TAC ora cancelado, que generosamente lhe concedeu mais 3 (três) anos além do prazo previsto pelo estudo do próprio IPT para a mudança da matriz energética já em 2.008.

O Governo até o momento não apresentou demonstrativo dos dez mil postos de empregos indiretos que foram prometidos. A DecisãoO Tribunal Regional Federal da 1ª Região por unanimidade de votos dos 3 desembargadores, no dia 05 de março, determinou a desconstituição do TAC, a suspensão na utilização de lenha pela empresa como matriz energética, anulou a sentença de 1º grau e ordenou a volta do processo ao juízo de origem para a realização de perícia sobre os danos ambientais e conseqüente prolação de sentença de mérito. “A decisão judicial neste processo é a demonstração de que a causa da Funaguas não é leviana ou patrocinada por ambientalistas fora da realidade, e sim uma causa coletiva contra a insustentabilidade deste empreendimento no Piauí, quando utiliza lenha nativa.”, comentou Judson Barros.

(*) Estudante de Jornalismo e membro da Rede Ambiental do Piauí

Extraído do site www.envolverde.com.br

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