18 outubro 2014

UMA PREMONIÇÃO SE FAZ REALIDADE


O banho de chuva parece revigorar nossas energias
Sou um cidadão dos anos 1950, nascido em meados desta década do século passado. E naqueles tempos nos deleitávamos com banhos de chuva nos verões calorentos. Isso quando nossa mãe aprovava essa peraltice. Pois sabia ela que, em caso de doenças, era quem deveria nos socorrer com aqueles chás miraculosos ou a “sopinha” capaz de revigorar um organismo acometido.
  
Minha adolescência tinha uma mistura que muitos jovens e adultos de hoje desconhecem totalmente. Vivíamos um tempo distante de equipamentos sofisticados. Pouco se conhecia de coisas eletrônicas e computadores. Mas isso não nos impedia de ser muito felizes. A maioria de nossos brinquedos era pura artesania, eivados de inventividade e criatividade.

E a natureza tinha inserção em muitas de nossas brincadeiras. Nelas se faziam presentes as árvores, os pássaros, os insetos, os animais domésticos, o fogo e a água. Toda essa maravilhosa miscelânea adentrava nossa realidade. Poderia aqui desfiar muitas brincadeiras que envolviam todos estes elementos. Mas um deles era meu preferido desde pequeno, a água.

A água foi sempre um elemento presente em minha infância
Próximo de nossa casa, havia alguns açudes que me encantavam. Meu respeito em relação à água tem origem nos conselhos de minha mãe, que com frequência nos alertava para alguns acidentes ocorridos com outras crianças. Por isso, qualquer banho de açude só ocorria com a “autorização” de minha mãe. Tenho a impressão de que, por segurança, às vezes nos permitia um “banho de mangueira” no jardim de casa. Sob seu olhar atento, ficávamos brincando por várias horas, até que nos chamasse para o banho e a troca de roupa no final da tarde. Não tínhamos muita preocupação com o consumo deste bem, pois nestes tempos a abundância não permitia perceber e nem presumir a falta dela por qualquer motivo que fosse.

Um dia ouvi um comentário de meu primo mais velho que também participava destas delícias, e que me deixou “preocupado”. Afirmou ele: “Eu já ouvi dizer que ainda vamos ter guerras por causa da água!“ Essa taxativa em minha cabeça juvenil teve o efeito de uma bomba. Balancei a cabeça atordoado com o que ouvira e pensei quase em voz alta: Isso é uma asneira! Ora, com tanta água por aí, quem vai brigar por causa dela? Mesmo que eu duvidasse, isso povoou meus pensamentos dali por diante.

A água potável representa uma pequena parcela do total disponível
Só quando me fiz adulto pude perceber a sabedoria daquela afirmação. Passei a ler mais sobre o assunto e notei que ela era plena de razão. Quando comecei a trabalhar em empresas, o contato com pessoas de decisão foi fundamental para eu entender a escassez dos recursos naturais. E do quanto os mesmos necessitam ser valorizados e utilizados com parcimônia e economia.

Houve um tempo em que me submeti a uma experiência enriquecedora e de grande conhecimento, mas extremamente difícil e complexa. Me candidatei a síndico do condomínio onde morava, e fui eleito para um mandato. Bastou para que eu entendesse a importância deste recurso indispensável na vida das pessoas. Mas também pude conviver com pessoas responsáveis e outras esbanjadoras. Algumas sequer se impressionavam com o desperdício de água.

A água necessária para produzir nossos alimentos
Mais adiante entendi a riqueza de nosso país neste tipo de recurso, principalmente com a descoberta do Aquífero Guarani, com mais de um milhão de quilômetros quadrados, a grande maioria em território brasileiro.

Outras vezes me espantava a escassez de água em determinados rios, que a cada temporada tinham seu potencial reduzido, principalmente pela utilização nas plantações. Também consegui entender há poucos anos o conceito de “Água Virtual”, que é aquela utilizada na elaboração, criação e produção de todos nossos víveres. Imaginem que para se produzir um quilo de arroz são necessários 2.500 litros de água, e que para 1 quilo de carne bovina são necessários quase 20.000 litros de água.

Mas agora, quando o estado de São Paulo expõe os leitos secos recortados e estriados de suas barragens, como se fosse uma carniça fétida ao sol, cobiçada por abutres famintos a espera do golpe final, entendo o que disse aquele meu primo.
São Paulo enfrenta uma das maiores secas de sua história

Houve um tempo em que eu imaginava que as guerras por água estavam distante de nós; que eram uma realidade do empobrecido e maltratado continente africano. Pensava eu: “Aqui nós temos rios que jamais secarão! Temos o Amazonas, maior rio do planeta; temos o Velho Chico na Serra da Canastra, o Madeira e o Solimões, em São Paulo o Tietê e o Pinheiros; o Uruguai e o Jacuí aqui no Sul. E muitos outros. Jamais nos faltará a água”. Ledo engano. Outro dia assisti moradores de um município paulista avançando sobre um caminhão pipa que não conseguia manobrar, sem que o motorista pudesse intervir. Em poucos segundos ele foi esvaziado. Então me perguntei: "Será que a guerra por aqui já tem data e hora prá começar?" Talvez estejamos às vésperas de que ocorra aquela premonição de meu primo.           
 

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Muito estimado colega Jairo, dupla dimensão na blogada de hoje:
1) a evocação de brincadeiras nossa infância, onde banho de chuva era o máximo.
2) o destaque acerca do consumo (e dos cuidados) do mais precioso dos líquidos.
A admiração do
Attico chassot
Mestrechassot.blogspot.com