15 novembro 2014

O FAZ-DE-CONTA DOS TREINAMENTOS

Trabalho em Espaço Confinado requer muitos cuidados 
A semana foi marcada por mais um acidente de trabalho, o que demonstra o quanto temos de avançar na prevenção destes eventos. [Até entrevistado eu fui, por uma rede de televisão local, a respeito do assunto. Veja vídeo abaixo...] E tão logo tive conhecimento do fato, de imediato me veio à mente a importância dos treinamentos a que as empresas estão obrigadas a proporcionar aos seus quadros de funcionários. Na maioria das normas regulamentadoras, é cada vez mais comum a importância dada a esta medida de proteção. Aquelas lançadas recentemente trazem em seu bojo o treinamento como aspecto significativo, e aquelas que passam por revisão da Comissão Tripartite respectiva, são modificadas em seu texto levando em conta a capacitação dos trabalhadores.

Exemplificando o que diz o texto de algumas normas, vejamos: a NR 01, Disposições Gerais, destaca no subitem 1.7, alínea “c” que “cabe ao Empregador informar aos trabalhadores os riscos profissionais que possam originar-se nos locais de trabalho e os meios para prevenir e limitar tais riscos e as medidas adotadas pela empresa”.

 Entrevista no jornal da Record esta semana

Já a NR 09, Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, no seu subitem 9.5.2 relata que “Os empregadores deverão informar os trabalhadores de maneira apropriada e suficiente sobre os riscos ambientais que possam originar-se nos locais de trabalho e sobre os meios disponíveis para prevenir ou limitar tais riscos e para proteger-se dos mesmos”.

Também a NR 10, Segurança em Instalações Elétricas e Serviços com Eletricidade, em seu conteúdo abre espaço para a capacitação no subitem 10.8.8: “Os trabalhadores autorizados a intervir em instalações elétricas devem possuir treinamento específico sobre os riscos decorrentes do emprego da energia elétrica e as principais medidas de prevenção de acidentes em instalações elétricas...”
 
Revista Proteção chama a atenção
Outra norma, a NR 18, PCMAT da Construção Civil, alerta no subitem 18.28.1 que “todos os empregados devem receber treinamentos admissional e periódico, visando a garantir a execução de suas atividades com segurança.”

Nos trabalhos em Espaço Confinado, tema de que trata a NR 33, há observância relativa ao treinamento no subitem 33.2.1, alínea “c”, que “Cabe ao Empregador garantir a capacitação continuada dos trabalhadores sobre os riscos, as medidas de controle, de emergência e salvamento em espaços confinados”

Aquelas empresas que contratam terceirizadas em seus ambientes também devem tomar cuidado com os treinamentos, pois não há espaço para esquecer destes trabalhadores. Como, por exemplo, o que destaca a própria NR 10 em seu texto. No subitem 10.13.2 a norma ressalta que “é de responsabilidade dos contratantes manter os trabalhadores informados sobre os riscos a que estão expostos, instruindo-os quanto aos procedimentos e medidas de controle contra os riscos elétricos a serem adotados”.

No caso do acidente desta semana, a mim pareceu não ter sido feita qualquer “Análise Preliminar de Riscos” ou "Permissão de Entrada e Trabalho" (PET) nesta tarefa fora de rotina executada pelo soldador Flávio Silva de Souza, de 43 anos, e que certamente deixou uma família sofrendo pela perda de mais esta vida. A diretoria da empresa afirma ter tomado todas as medidas preventivas necessárias. Mas não se ouviu nenhum relato da existência de um Vigia no local, exigência colocada no conteúdo de treinamento da NR 33. Muito menos tomei conhecimento de algum instrumento de monitoramento das condições ambientais do espaço confinado onde Flavio trabalhava. Ou seja, me parece que a negligência da empresa foi um condicionante neste acidente, nesta morte. Será que este funcionário recebeu treinamento, e sabia o potencial dos riscos presentes ali?
 
Acidente aconteceu com trabalhador que soldava
em navio ancorado em Porto Alegre para reforma
Mas o que mais tem me preocupado é a qualidade dos treinamentos que tem sido ministrados em algumas empresas. Pessoas sem qualquer qualificação, com parco conhecimento do assunto e da ciência prevencionista, tem se arvorado como instrutores de qualquer conteúdo de segurança do trabalho. E pior ainda. As empresas tem se omitido na avaliação da qualidade destes treinamentos.

Há mais de 15 anos tenho empresa de consultoria que ministra alguns cursos nesta área, principalmente referente à formação de membros da CIPA e de Brigada de Incêndio. Nosso maior cuidado é proporcionar uma formação adequada e extremamente responsável, com profissionais legalmente habilitados e que tenham expertise no assunto. Mas fico preocupado com algumas empresas e com o que tenho constatado vez por outra.

Os treinamentos muitas vezes são ministrados por pessoas
sem conhecimento do assunto
Dia desses, ao contatar uma empresa que solicitara orçamento de Curso de CIPA, a responsável pela área de treinamento me deixou pasmo. Disse-me ela: “Sr. Jairo! Nossa empresa já realizou o treinamento de CIPA dos funcionários. Felizmente saiu bem mais em conta, e foi à distância!” Não pude me conter com a resposta da empresa, e fiz contato com o Ministério do Trabalho para saber se isso era possível. A resposta foi que o assunto ainda está em estudos por comissão responsável naquele órgão.

De outra feita, uma Escola onde atuo me convocou para ministrar palestra sobre Segurança na Construção Civil em um canteiro de obras. De bom grado, preparei o material, e na data marcada estava lá, onde falei por quase duas horas a trabalhadores atentos. Dois meses depois, uma funcionária da empresa de construção me ligou solicitando se eu podia emitir certificados deste treinamento para os trabalhadores, com carga horária de oito horas, e que a empresa me pagaria por isso. Declinei da proposta sugerida. Tenho um nome a zelar.  

Alguns cuidados tem de ser tomados na hora de escolher o treinamento

Ou seja, o que tem acontecido é que a empresa “faz de conta” que treina, e o instrutor “faz de conta” que ensina. E no final, o resultado está aí!  Isso mostra que há despreparo por parte de alguns trabalhadores no entendimento dos riscos a que estão expostos. De outro lado, também se vê empresas negligentes na capacitação adequada de seu quadro funcional. Para mim, treinamento é coisa séria e precisa ter qualidade, no conteúdo e de quem o ministra.   

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Muito estimado Jairo,
quando há uma semana agradecia a homenagem que recebi na edição da semana pretérita de teu blogue dizia: “O Jairo tem como nuclear de seu fazer profissional (e, também, mote de seu blogue) a segurança do trabalhador. Nisso ele tem expertise, ministrando cursos e proferido palestras acerca do tema” {mestrechassot.blogspot.com dia 10NOV2014). A tua edição que circula neste fim de semana ratifica minha assertiva. Lamentavelmente catalisou tua blogada um crônica acerca de uma morte anunciada que traz uma tarja dolorosa e veraz? INSEGURANÇA NO TRABALHO. Parabéns por tu seres o apóstolo da segurança do trabalhador e fazeres de teu blogue um púlpito na defesa dos trabalhadores.
O destaque que das em tua entrevista na Bandeirante às não rotinas que vitimam especialmente na construção civil se muito oportuno.
Cumprimentos pela denúncia a cursos "faz-de-conta"!
Obrigado, Jairo, pelos teus repedidos alertas.