28 março 2015

ENFIM, O PROJETO DOS FRIGORÍFICOS

A nova NR36 estabelece requisitos mínimos para
o setor de carnes e derivados
Por muitos anos trabalhei no segmento de abate e processamento de carnes e derivados, e tenho consciência da necessidade de melhoria para estes trabalhadores tão sofridos em suas atividades. Por isso, acompanho com interesse a implantação da NOVA NR 36. A norma seguiu seu tramite normal desde o início, com uma redação inicial muito bem feita, um período de consulta pública para aquinhoar opiniões e sugestões e a posterior publicação em 18 de abril de 2013. Como sempre faz, o Ministério do Trabalho e Emprego aguarda um período de adaptação do segmento, para que seja oportuno a adaptação do setor às novas regras. Do lado empresarial, como sempre, houve “choro e ranger de dentes” após a publicação do texto.

Uma grande parcela destes empresários com poder de “lobby” junto ao congresso, acorreram a Brasília buscando apoio de seus “cupinchas”, os parlamentares patrocinados em suas campanhas com recursos do segmento alimentício de carnes. Aliás, se houvesse uma “lava-jato” neste segmento, certamente teríamos muitas surpresas. Ali também não se enganem, imperam favorecimentos e muitas cumplicidades.

As pausas e intervalos pretendem amenizar as doenças ocupacionais
Um dos pontos mais importantes da norma são os itens que tratam das pausas durante a jornada de trabalho. Cabe ressaltar que um dos maiores acometimentos do setor são as doenças relacionadas a movimentos repetivivos, principalmente nas atividades de abertura, limpeza e espostejamento de carcaças, onde os prejuízos aos membros superiores e à coluna são motivadores de afastamento e de inutilização desta mao-de-obra. Por isso, a NR 36 estabeleceu no item 36.13.1, da “Organização Temporal do Trabalho”, que trabalhadores que desenvolvam atividades em ambientes artificialmente frios e onde se movimentam mercadorias do ambiente quente ou normal para o frio e vice-versa, depois de uma hora e quarenta de trabalho contínuo, devem ter assegurados um período mínimo de vinte minutos de repouso. E este item está sendo contestado com projeto de Lei do deputado Silvio Costa do PTB de Pernambuco, ele que certamente defende o “lobby” de algum patrocinador de campanha.

Outro item contemplado na norma, relativo às pausas no trabalho, é o de número 36.13.2, que trata das pausas psicofisiológicas para os trabalhadores que exercem atividades desde a recepção de animais até a expedição, em que são exigidas repetividade e/ou sobrecarga muscular do pescoço, ombros, dorso e membros superiores e inferiores. Nestes casos, a empresa deverá obedecer a tabela abaixo, de acordo com as jornadas cumpridas em cada unidade de abate e processamento:
 
Tabela de Pausas Psicofisiológicas
Estes são somente alguns itens que podem ajudar a melhorar as condições de trabalho para esta categoria que durante anos a fio fez da indústria da carne brasileira uma das mais rentáveis do planeta. Fazendo uso de uma mao de obra pouco qualificada e incapaz de se mobilizar em prol de seus direitos, tal como se observa na construção civil, este setor enriqueceu e aos seus proprietários. Pois chegou a hora da contrapartida.

Em 2015, o Ministério do Trabalho e Emprego do Rio Grande do Sul adotou o projeto da NR 36 como tema de suas inspeções. A Revista Proteção de março publica que “os auditores-fiscais realizaram ação no Frigorifico Silva Indústria e Comércio Ltda. de Santa Maria, entre os dias 17 e 20 de março, com a participação do Ministério Público do Trabalho, onde ocorreu a interdição do mesmo.” Foram constatadas situações de grave e iminente risco à saúde e à integridade física dos trabalhadores em razão de movimentos repetitivos em excesso, emprego contínuo de força para movimentar mais do que os 23 quilos permitidos por lei, ausência de dispositivos de segurança nas máquinas, falta de acompanhamento médico e verificação de jornada de trabalho exaustiva. Para o coordenador do projeto, Mauro Muller, o carregamento manual de peças bovinas inteiras, como o dianteiro e o traseiro, que pesam cerca de 120 quilos, é inadmissível. (reportagem disponível em http://www.protecao.com.br/noticias/geral/auditores-fiscais_iniciam_projeto_frigorificos_2015_no_rs/AQjbAJy5/7958)  
O setor acumula atividades de grande insalubridade


Portanto, nota-se que o cumprimento das exigências da norma só ocorre, na maioria das vezes, mediante a fiscalização e imposição de autuação das autoridades fiscalizadoras. São raras as iniciativas próprias de empresas que assumem a responsabilidade e se antecipam às inspeções. O alerta inicial está dado, e o prazo está esgotado para que as empresas se adequem. Minha expectativa é de que as grandes redes de supermercados da capital, onde tenho visto inúmeras irregularidades na manipulação em seus açougues, também se invistam de responsabilidade e criem ambientes de trabalho mais saudáveis. Afinal, como diz o texto inicial da NR 05-CIPA, o trabalho deve ser compatível com a preservação da vida e a promoção da saúde do trabalhador. 

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Muito estimado Jairo,
no primeiro lançar d’olhos a tua blogada, por ser algo muito particular, parece que não vai seduzir-nos. Logo, atendendo à necessidade de uma leitura mais atenta, vemos as muito significativas informações que ofereces.
Este texto desta semana é manancial para densa aprendizagem.
Obrigado, muito valeu a leitura.