Em plena crise que assola o Estado e a economia
nacional, mais uma Feira do Livro se inaugura este final de semana na capital gaúcha.
E com ela autores e títulos mostram suas habilidades com a palavra escrita. Há
ali inúmeros temas esperando ansiosamente leitores ávidos por beberem destas fontes de
saberes. Quantas noites em claro foram necessárias para a inspiração daquelas histórias, para elaboração daqueles adágios, para concepção daquelas poderosas argumentações;
e que agora serão talvez capazes de modificar pensamentos, de edificar novas
realidades, de construir novas opiniões, e até mesmo de deslumbrar os mais
inocentes no assunto.
Socióloga Zoara Failla |
Mas a feira é também capaz de nos trazer reflexões um
tanto infaustas, quando observamos a realidade em relação ao nosso
potencial de leitura. Uma pergunta retoma meu pensamento a cada evento: “Porque
o brasileiro lê tão pouco?” Como sempre faço, procurei mais uma vez algumas
fontes que pudessem me auxiliar nesta interrogação.
Justificativas há aos montes para nossa reduzida capacidade
de leitura, desde o preço elevado dos livros até a ausência de bibliotecas na
grande maioria dos municípios. Uma das fontes que me deram boa impressão foi o
trabalho de pesquisa da socióloga Zoara Failla, que pesquisou hábitos de leitura
e constatou que uma grande parcela dos responsáveis pelo ensino em nosso país não
gosta de ler. Na obra “Retratos da Leitura do Brasil 3” ela demonstra numa
amostra realizada com mais de 5.000 entrevistados que apenas 145 disseram
gostar de ler no tempo livre. Isso significa tao somente 2,9% dos
entrevistados. Dentre estes 145, grande parte destacou preferir títulos de
autoajuda ou religiosos. Não que os temas sejam irrelevantes, mas isso
demonstra certa resistência ao conhecimento científico em geral.
Nosso desempenho em relação aos vizinhos é baixo demais |
Zoara também destaca que as próprias escolas de Ensino
Médio e Universidades não valorizam o hábito durante a formação. Também as
bibliotecas sofrem com a desatualização do acervo. O baixo nível salarial dos
professores também contribui para a parca aquisição de títulos.
O site “Homo Literatus”, especializado na crítica de
literatura, com diversos autores compondo seu elenco, em abril deste ano teceu
críticas ferozes ao leitor brasileiro. Relembrando uma entrevista que foi ao ar
em rede nacional de televisão, onde um entrevistado ao ser perguntado porque não
havia lido nenhum livro no ano anterior, trouxe como resposta “porque deixou
passar”. Sendo assim, o editor do “Homo Literatus” atribui à “preguiça”
nacional um dos maiores motivos da nossa pouca leitura. Diz ele que
independente de credo, raça, cor, classe social e nível de escolaridade, “dos
homens pompudos de terno que se orgulham de pôr nos seus currículos os MBAs aos
mais simples cidadãos, passando inclusive por muitos professores, até os de literatura,
do Brasil não gostam de abrir um livro”.
Os editores do site "Homo Literatus" acreditam que há preguiça do leitor brasileiro |
O crítico do site ainda lembra do Plano Nacional do
Livro e da Leitura, que faz chegar às Escolas Públicas caixas e mais caixas de
livros bonitos e prazerosos, e que vão amargar a solidão nas próprias caixas ou
nas prateleiras de uma biblioteca esquecida.
Segundo Raphael Soeiro, da Revista Superinteressante, de
acordo com a Unesco, órgão da ONU que cuida da educação e cultura, a leitura só
existe onde: a) ler é uma tradição nacional, b) o hábito de ler vem de casa, c)
são formados novos leitores. Para ele o problema é antigo: muitos brasileiros
foram do analfabetismo à TV, sem passar pela biblioteca.
A televisão, assim como a Internet, se tornaram grandes concorrentes da leitura |
Também acredito que a Televisão seja uma grande
concorrente da leitura, pois impõe falsas realidades e aliena pelo pouco
esforço na reflexão e entendimento. Ali somos entulhados de conteúdos cientificamente
direcionados e pré-elaborados. Tenho certeza de que um marketing diabólico está
por detrás de quase oitenta por cento daquele conteúdo.
E como não bastasse, embora o reconheça como importante e transformador na condução e divulgação do conhecimento, outro veículo que está alienando e concorrendo com a leitura, e que adentrou o novo milênio com extremo vigor, fazendo de nossa juventude
um verdadeiro quintal de prazeres fúteis, foi a internet, com todo seu aparelhamento.
A síndrome da “leitura mínima” das mídias sociais, dos smartphones e dos
tablets imputa a lentidão e a preguiça em grande parcela dos leitores, fazendo
com que quase todos não ultrapassem sequer um parágrafo sem se fazerem
enfadonhos antes de entrarem no seguinte. E isso se tem visto em sala
de aula, quando o professor se atreve a pedir a leitura e interpretação de um
texto. Tempos difíceis estes.
Um comentário:
Meu caro Jairo,
muito oportuno, em tempos de mais uma edição de ‘nossa’ feira do livro (que também está em baixa) a blogada desta semana. Trazes dados preocupantes.
Não adiro, todavia, a tua leitura catastrofista: “Tenho certeza de que um marketing diabólico está por detrás de quase oitenta por cento daquele conteúdo”. A meu juízo, a televisão não é a responsável por isso. Já temos televisão há bem mais de meio século. Credito muito da não leitura — e aqui nos incluo enquanto intelectuais — às modernas plataformas disponíveis para acesso à informação. Veja como os smartphones reduziram a leitura de nossos blogues, mesmo que estes aparelhos que superam qualquer das engenhocas que tinha o James Bond, ofereçam à leitura de nossos textos em qualquer lugar.
Este teu texto de hoje, com dados, gráficos, ilustrações, excelente diagramação não é palatável num smartphone. Eu acessei num deles. Vim ler no notebook.
Lamento te confessar que mesmo tenha comprado no último mês mais de seis livros não tenho tempo (desculpa que não é mais furada) para ler, como lia há dez anos.
Desculpa se desiludo teus leitores, aqui e agora
attico chassot
mestrechassot.blogspot.com
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