Os acidentes de trabalho possuem um custo muito alto para todos os setores da sociedade. Mas, se esses acidentes atingem aqueles que recém estão ingressando no mercado de trabalho, isso importa na perda de nossa força maior para o futuro. E se esses eventos estão ceifando nossas promessas, que atitudes se tem tomado para evitá-los? Por isso, na postagem de hoje quero trazer um texto que muito tenho utilizado nas aulas em escolas técnicas. Esse texto é parte do Capítulo IV do livro "Análise de Acidentes de Trabalho Fatais no RS", publicado em 2008 pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do RS.
"Se os acidentes do trabalho são uma forma de violência a ser combatida por toda a sociedade, o que dizer dos acidentes do trabalho que atingem crianças ou adolescentes? Tais ocorrências demonstram uma dupla falência social: na erradicação do trabalho infantil e do trabalho penoso, insalubre e perigoso do adolescente e no combate aos acidentes do trabalho.
O trabalho infantil chegou ao país com as caravelas: há registros de meninos trabalhando como marinheiros nessas embarcações. No período colonial, a situação de crianças negras e índias não era melhor que a de seus pais escravizados, sendo obrigados a trabalhar já aos quatro ou cinco anos de idade. A partir da abolição da escravatura e do início da era industrial, o trabalho infantil, essencialmente rural, tomou vulto também nas cidades. Nessa época, e assim como acontecia na Europa, a mão-de-obra de crianças (e mulheres) também foi preferida, muitas vezes, por ser mais dócil e mais barata.
A primeira tentativa de regulamentação do trabalho infantil no Brasil data de 1891, quando o Decreto nº 1.313 definiu que meninas de 12 a 15 anos e meninos de 7 a 14 teriam uma jornada de trabalho máxima de 7 horas diárias. Dessa época, até os nossos tempos, a legislação brasileira evoluiu de forma marcante, no que tange ao cuidado com a infância e a adolescência, podendo ser considerada avançada: desde a CLT, passando pela Constituição de 1988 e culminando com o
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
No entanto, a distância entre as intenções da legislação e a realidade ainda é grande, sua redução esbarra em problemas sócioeconômicos e também em crenças culturais ou preconceitos, tais como a de ser o trabalho a única alternativa viável à marginalização e à delinqüência dos jovens nas populações mais pobres. Contrariamente, estudos científicos realizados em diversos países mostram que adolescentes que trabalham consomem álcool, tabaco e outras drogas lícitas e até ilícitas em quantidades expressivamente maiores do que jovens não-trabalhadores. Assim, o tempo livre ou não ocupado com o trabalho não é necessariamente determinante para o uso de drogas, no caso de adolescentes. Outros fatores devem ser considerados, tais como: oportunidade de contato, no trabalho, com pessoas que fazem uso de drogas; maior disponibilidade de recursos financeiros entre os estudantes que trabalham, facilitando a aquisição dessas substâncias; maiores exigências entre os estudantes trabalhadores, o que poderia implicar consumo maior de álcool, cigarros para alívio de tensões, e/ou anfetaminas, por exemplo, na busca de maior disposição e energia para enfrentar as demandas de trabalho e escola.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), havia, em 2006, no estado do Rio Grande do Sul, uma população de 2.406.000 crianças e adolescentes na faixa etária entre 5 e 17 anos, das quais 320.000 trabalhavam, ou seja, 13,3%. Estratificado por faixa etária entre os 5 e 13 anos, quando o trabalho é proibido pela legislação, foi encontrado um percentual de 5,6% das crianças ocupadas com trabalho.
Os jovens trabalhadores dedicavam-se em 54,8% dos casos a atividades não agrícolas e 45,2% a atividades ligadas à agricultura; 52,3% não recebiam remuneração e, quando a recebiam, 26,3% entregavam seu rendimento, ou o empregador o fazia, no todo ou em parte, aos pais ou responsáveis.
Importante a constatação, naquele estudo, de que 17,9% dos indivíduos na faixa dos 5 aos 17 anos que trabalhavam, não estudavam. Esta cifra se reduz a 9,1% das crianças e adolescentes na mesma faixa etária que não trabalhavam, demonstrando o efeito nocivo do trabalho precoce sobre a escolaridade. Quanto à acidentalidade, observamos que é difícil obterem-se dados oficiais mais detalhados. Nas estatísticas da Previdência Social, as publicações habitualmente incluem em uma faixa etária única todas as ocorrências com segurados até 19 anos, o que não permite nenhuma conclusão a respeito dos acidentes do trabalho na infância e adolescência.
Nos dados do IBGE, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2006, foram registrados cerca de 10.000 acidentes do trabalho em crianças e adolescentes entre os 5 e 17 anos, no estado do Rio Grande do Sul, ou seja, em 3% desses trabalhadores. Nesses dados, não encontramos detalhamento do tipo de lesão, mas apenas a informação relativa à “ocorrência de machucado ou doença, no período de referência de 365 dias, devido ao trabalho principal”.
Na publicação “Boletim Epidemiológico” v.9, nº.1, março, edição especial, 2007, do Centro Estadual de Vigilância em Saúde/RS, em estudo relativo aos acidentes de trabalho registrados no Sistema de Internação Hospitalar, Rio Grande do Sul, no período de 2003 a 2005, verifica-se que 17,4% (491 casos) das hospitalizações por acidente do trabalho ocorreram em trabalhadores com até 17 anos e13% (367 casos) até 13 anos. Considerando que estes dados dizem respeito a acidentes que exigiram hospitalização, pode-se ter uma idéia da magnitude e importância desses eventos como causa de agravos à saúde e segurança na infância e adolescência."
Fonte: "Análise de Acidentes de Trabalho Fatais no RS". SRTE/RS - 2008
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