17 julho 2010

A ERVA-MATE QUE ESCRAVIZA

A sala de aula muitas vezes se torna um ambiente propício para discussão de controvérsias, onde aproveito para trazer algumas realidades desconhecidas de nossos alunos. O trabalho escravo, por exemplo, é um deles. A maioria dos alunos acredita que essa prática só ocorre na região nordestina, ou ainda, na região norte do país. Quando falamos que essa realidade permeia todo o país, muitos se assustam e custam a acreditar. Mas os fatos esclarecem mais do que a própria teoria.

Gosto muito de salientar esses aspectos com os alunos de Segurança do Trabalho, quando trabalhamos a Norma Regulamentadora NR-31 - Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuaria, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura. Até porque essa NR traz todos os aspectos necessários às boas condiçoes de trabalho, saude e segurança nessas atividades.

Recentemente, a Revista Proteção trouxe reportagem a respeito de um trabalho escravo no vizinho estado catarinense, adotado por empresa renomada da área alimentícia. Numa operação conjunta do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT) e Polícia Federal (PF) realizada em meados de junho em Santa Catarina ocorreu a libertação de 12 trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravos na fazenda Maxiplast Agropecuária LTDA, entre eles quatro menores de 18 anos.

De acordo com o MPT, a fazenda, no município catarinense de Calmon (região meio-oeste do Estado) é ligada ao grupo Embalagens Maxiplast LTDA, e tem como proprietário Cláudio Anito Busato. A Maxiplast atua na produção de embalagens para a indústria alimentícia, com destaque para as empresas frigoríficas, e fornece material para grupos como BR Foods (proprietária das marcas Sadia e Perdigão), JBS e Seara.

Na operação realizada na fazenda em Calmon pelo grupo móvel de fiscalização do governo federal na região Sul, a situação dos trabalhadores era bastante problemática e eivada de irregularidades.Os trabalhadores resgatados estavam alojados em uma casa em "dois apertados quartos e uma cozinha, constatando-se condições de degradância, desde falta de higienização, excesso de trabalhadores por dependência, falta de camas, com a utilização de pedaços de espuma fétida como colchão, roupas de cama e cobertores com idêntico aspecto, botijão de gás no mesmo ambiente dos quartos e cozinha", conforme aponta o relatório do MPT.

Na frente de trabalho dedicada à colheita, não eram fornecidas condições mínimas de trabalho decente aos empregados. Não havia o fornecimento de água potável nem de equipamentos de proteção individual, além de não haver sanitários e lugar coberto para refeições.

Os empregados foram aliciados para o trabalho por um empreiteiro de mão-de-obra (a tradicional figura do "gato"), sendo que os doze não possuíam Carteira de Trabalho e da Previdência Social (CTPS) assinada. Na fazenda, havia outros cinco trabalhadores com a CTPS em situação regular.

O empreiteiro "teria comprado a erva em pé", hábito comum na região, ou seja, comprado toda a floresta de erva-mate, pagando um valor fixo por arroba colhida - o equivalente a quinze quilos de erva.

Para o procurador do MPT Eder Sivers, que acompanhou a operação, o empreiteiro, de apelido "Tonico", não tinha condições financeiras efetivas para adquirir toda a floresta, instalada numa fazenda de 208 alqueires, pouco mais de 500 hectares.

A auditora-fiscal do MTE Luize Surkamp Neves explica que a empresa de "Tonico" estava na verdade em nome de sua esposa, Eliane Silvia Miersch, e que realmente possuía capital inicial muito baixo para aquele tipo de transação.

Boa parte dos trabalhadores vinha das cidades próximas à fazenda, dos Estados de Santa Catarina e Paraná. A maioria havia chegado a menos de um mês no local e recebia cerca de R$ 1,20 por arroba colhida de erva-mate, o que, segundo o procurador Eder Sivers, gerava renda de no máximo um salário mínimo por mês.

O caso comprova que a prática do trabalho escravo não é exclusividade das regiões Norte e Nordeste, e que os Coronéis de Fazenda que entraram para os livros de História como característica daquelas regiões, existem também muito próximo de nós aqui no Sul do país. Portanto, nunca se deve afirmar que nossa região é uma região livre desses estigmas, e que, por aqui, se prima pela regularidade nas relaçoes de trabalho.

Também aprendi com o Dr. Roque Puiatti que muitas dessas irregularidades coabitam tranquilamente em nossa região, quando nos mostrou em palestra recente as metas da SRTE/RS no combate ao Trabalho Infantil e Trabalho Escravo no RS.

A reportagem completa sobre o caso do trabalho escravo está disponível em http://www.protecao.com.br/site/content/noticias/noticia_detalhe.php?id=JyyJJjjj

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Meu caro Jairo
e também os estimados leitores de teu blogue, outra vez nos trazes um tema doloroso e quase desconhecido: o escravagísmo no século 21 e mais entre nós. Permito-me na mesma direção recomendar 13.- Coltan: o precioso ouro azul, manchado de sangue que publiquei neste dia 13 no meu blogue.
Vamos tomar chimarrão diferente depois desta blogada com.
Com admiração

attico chassot