Sou reticente em citar exemplos domésticos. Mas, às vezes me atrevo. Outro dia, uma coisa comum entre os jovens, minha filha falava de uma menina que estava olhando para ela de forma insistente. E comentou comigo: “Pai! Aquela menina não para de me olhar. Eu creio que ela está com inveja de mim, pelo olhar fulminante com que mira”. Disse a ela: “Pensaste, filha, que talvez ela esteja pensando o mesmo de você? Isso também pode ser chamado de pré-julgamento. E o pré-julgamento é preconceito. Ou seja, não damos a oportunidade de as pessoas se defenderem e já estamos acusando-as”. Depois de alguns minutos refletindo, minha filha disse: Pai! Sabes que tu tens razão? E quantas vezes tenho pensado erroneamente a esse respeito!” E esse desabafo me valeu o final de semana. Pareceu-me que naquele momento atingi o ápice de minha tarefa paterna e docente.
Mas como agir num mundo em constante transformação? Um mundo em que nós que nascemos na metade do século passado temos a mania de viver pregando conselhos aos mais novos, quando também estamos repletos de dúvidas em relação ao futuro e ao comportamento adequado dentro dessa nova realidade? Acredito que vocês, tal como eu, observam que este mundo passa por transformações, e que não sabemos onde vai desaguar. Certas horas sou tomado de pânico ao imaginar qual seria o resultado final disso tudo. Aliás, essa transformação por que passa o Oriente Médio atualmente, com a derrubada das ditaduras pela urgência popular democráticas, nem especialistas das relações internacionais são capazes de fixar prognósticos.
Veiga-Neto ao analisar o currículo como uma contribuição para estabelecer novas articulações entre o espaço e o tempo, recortando-o dentro dos conceitos da modernidade e pós-modernidade, observa que nesses novos tempos
“as interpelações culturais a que estamos sujeitos parecem ser cada vez mais variadas, multifacetadas; parece que estamos, a cada momento, “expostos” a novas práticas sociais e a grupos e situações culturais muito diversos. Cada vez mais, parece que a diferença está aí e veio para ficar... Desse modo, podemos assumir – a cada momento, em cada cenário, em cada circunstância – identidades bastante diversas. Numa Pós-Modernidade cada vez mais cambiante, fluida e nômade, também as identidades se apresentam como “metamorfoses ambulantes”.”
Portanto, se somos “metamorfoses ambulantes”, no relato de Veiga-Neto, resgatando parte da canção do roqueiro brazuca Raul Seixas, como podemos adotar uma postura de conselhos e advertências em relação ao futuro? Não será por esse motivo que o preconceito e a agressão tem sido lugar comum entre nós? Principalmente, por não conseguirmos adotar uma padronização em relação ao modo como queremos criar nossas futuras gerações. E assim como a realidade mundial tem sido fruto desses dois condicionantes, espaço e tempo, nós também somos acossados a nos moldar a eles.
O certo é que devemos adotar uma postura diagnosticadora dos comportamentos, de forma a estar isentos de atitudes preconceituosas. E, embora muitas vezes faça esse exercício com grande disciplina, me apanho em situações que me imputam culpa por preconceito.
E um desses preconceitos, que fez com que eu assumisse essa postura de “mea culpa” essa semana, foi a indicação do Deputado Francisco Everardo Oliveira Silva, o Tiririca, para integrar a Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados. De imediato fui assolado pela indignação, pois sou extremamente exigente em relação à ciência da Educação, e acredito piamente que para desempenhar funções dessa magnitude é necessário boa formação, conhecimento e muito comprometimento. Mas diante desse fato fiquei perguntando: Estaria certo o Partido da República ao indicar o ex-palhaço (e aqui já vai imensa dose de preconceito) para a comissão, tendo em vista sua habilidade com o entretenimento, que também é parte da cultura? Que contribuições o novo membro poderia trazer à Educação do país?
Pois bem, meus leitores amigos. Dessa vez estou atarantado pela dúvida. Estarei sendo preconceituoso com relação à indicação de Tiririca para o cargo em questão? Gostaria da opinião de vocês, pois considero Educação uma coisa que deve ser levada a sério. E nesse momento, tenho sérias dúvidas se isso acontece no órgão maior de nosso Poder Legislativo, mesmo que seja impingido pelo rótulo de “preconceituoso”.
Referência Bibliográfica:
NOTA DE PESAR:
HOJE (27 DE FEVEREIRO DE 2011) O RIO GRANDE DO SUL PERDE UM DE SEUS MAIORES INTELECTUAIS:
Moacyr Jaime Scliar (Porto Alegre, 23 de março de 1937 - Porto Alegre, 27 de fevereiro de 2011) foi um escritor brasileiro. Formado em medicina, trabalhou como médico especialista em saúde pública e professor universitário. Nasceu em Porto Alegre (RS), no Bom Fim, bairro que até hoje reúne a comunidade judaica, a 23 de março de 1937, filho de José e Sara Scliar. Sua mãe, professora primária, foi quem o alfabetizou. Cursou, a partir de 1943, a Escola de Educação e Cultura, daquela cidade, conhecida como Colégio Iídiche. Transferiu-se, em 1948, para o Colégio Rosário, uma escola católica. Em 1963, após se formar pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, iniciou sua vida como médico, fazendo residência médica. Especializou-se no campo da saúde pública como médico sanitarista. Iniciou os trabalhos nessa área em 1969. Em 1970, frequentou curso de pós-graduação em medicina em Israel. Posteriormente, tornou-se doutor em Ciências pela Escola Nacional de Saúde Pública. Já foi professor na faculdade de medicina da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). Foi o sétimo ocupante da cadeira 31 da Academia Brasileira de Letras. Foi eleito em 31 de julho de 2003, na sucessão de Geraldo França de Lima, e recebido em 22 de outubro de 2003 pelo acadêmico Carlos Nejar.
Para se ter idéia do talento de Moacyr Scliar de sua produção literária constam 13 contos, 20 romances, 23 livros de ficção infanto-juvenil, 6 cronicas e 4 ensaios. É detentor de 5 prêmios de literatura.
Resta a saudade de todos que como eu admiravam seu trabalho literário.
3 comentários:
Meu caro Jairo,
uma vez mais teu blogue traz um alerta para nós, especialmente enquanto assumimos nossas ações como educadores não formais. Talvez uma das tarefas mais árduas que temos enquanto pais e alertar a nossos filhos ~~ como descreves com pertinência, para que deixem de laborar em preconceito. Teu texto deste domingo mereceria figurar em qualquer cartilha de uma Escolas para Pais.
Meu blogue de hoje aliou-se as bem postas e merecidas homenagens que fazes a Moacyr Scliar.
Um bom março que se avizinha anunciando o desejado outono,
attico chassot
http://mestrechassot.blogspot.com
www.atticochassot.com.br
hi, good site very much appreciatted
Mestre Jairo, digo para você uma coisa, é necessária uma pessoa que sofreu com as péssimas condições de ensino deste país na comissão de educação...
do que adianta colocar intelectuais discutirem novas matérias nas escolas brasileiras quando para nossas crianças não são lecionadas os ensinamentos básicos de química e física?
o povo brasileiro sofreu durante muito tempo nas mãos dos intelectuais elitistas... deixamos nós, agora, sermos os governantes. sou contra a eleição de tiririca, mas o povo merece os representantes que tem, e do fundo do pouco conhecimento que tenho acredito que tiririca fará mais pelo futuro da educação do Brasil, pois sofreu com a falta dela, do que qualquer parlamentar elitista, que quer que o povo continue sem educação.
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