29 maio 2011

EM LUTO OUTRA VEZ A CAUSA AMBIENTAL

Mais um crime mancha a história ambiental brasileira. O Brasil se torna conhecido mundialmente pela execução corriqueira de pessoas defensoras das propostas ambientais que, além de amparar pequenas comunidades que buscam na atividade extrativa uma forma de sobrevivência e denunciarem atitudes predadoras dos recursos naturais, resguardavam as reservas naturais da cobiça do lucro a qualquer preço. Já perdemos alguns expoentes nesta luta sem tréguas, e não se pode ficar INDIFERENTE a essas mortes, sob a pena de sermos qualificados de “memória curta”.

Já perdemos Chico Mendes, defensor da atividade extrativa do látex nos seringais de Xapuri. Chico Mendes, ainda criança, começou seu aprendizado do ofício de seringueiro, acompanhando o pai em excursões pela mata. Só aprendeu a ler aos 19 e 20 anos, já que na maioria dos seringais não havia escolas, nem os proprietários de terras tinham intenção de criá-las em suas propriedades.

Em 22 de dezembro de 1988, em Xapuri, no estado do Acre, exatamente uma semana após completar 44 anos, Chico Mendes foi assassinado com tiros de escopeta no peito na porta dos fundos de sua casa, quando saía de casa para tomar banho. Chico anunciou que seria morto em função de sua intensa luta pela preservação da Amazônia, e buscou proteção, mas as autoridades e a imprensa não deram atenção.

Outra morte anunciada foi a de Irmã Dorothy Stang. Religiosa norte-americana naturalizada brasileira. Pertencia às Irmãs de Nossa Senhora de Namur, congregação religiosa fundada em 1804 por Santa Julie Billiart e Françoise Blin de Bourdon. Esta congregação católica internacional reúne mais de duas mil mulheres que realizam trabalho pastoral nos cinco continentes. Dentre suas inúmeras iniciativas em favor dos mais empobrecidos, Irmã Dorothy ajudou a fundar a primeira escola de formação de professores na rodovia Transamazônica, que corta ao meio a pequena Anapu. Era a Escola Brasil Grande. Irmã Dorothy recebeu diversas ameaças de morte, sem deixar intimidar-se. Pouco antes de ser assassinada declarou: «Não vou fugir e nem abandonar a luta desses agricultores que estão desprotegidos no meio da floresta. Eles têm o sagrado direito a uma vida melhor numa terra onde possam viver e produzir com dignidade sem devastar.»

Irmã Dorothy Stang foi assassinada, com seis tiros, um na cabeça e cinco ao redor do corpo, aos 73 anos de idade, no dia 12 de fevereiro de 2005, às sete horas e trinta minutos da manhã, em uma estrada de terra de difícil acesso, à 53 quilômetros da sede do município de Anapu, no Estado do Pará, Brasil.

Nesta semana, dia 24 de maio, mais dois personagens defensores da floresta foram emboscados, José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo. Vinte dias antes de ser morto a tiros, o casal de líderes extrativistas enviou um documento ao Ministério Público Federal de Marabá denunciando o envolvimento de três madeireiras da região de Nova Ipixuna, no Pará, em crimes ambientais. Assim como eles, outros 28 trabalhadores rurais e ambientalistas integram a lista das pessoas marcadas para morrer no Estado do Pará, segundo documento entregue oficialmente pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) ao Ministério da Justiça em abril deste ano.

O Pará é o Estado que lidera as estatísticas. Ali, em 2010 foram registradas 18 mortes, mais que a metade do total relativo ao Brasil inteiro. O cenário é o mesmo quando se consideram os dados da Ouvidoria Agrária Nacional, do Ministério do Desenvolvimento Agrário: o levantamento apontou 63 homicídios no campo entre janeiro e dezembro de 2010, sendo 11 deles decorrentes de conflitos agrários. Destes 11, o Pará foi o palco de sete.

E prá notar que o caso na região é alarmante e merece uma atenção bem maior das autoridades federais, neste sábado, 28 de maio, uma das testemunhas-chave para esclarecer a morte do casal de extrativistas foi encontrada morta; Erenilton Pereira dos Santos, 25 anos, integrante do assentamento Praialta-Piranheira, o mesmo onde vivia o casal José Claudio Ribeiro e Maria do Espírito Santo, executados na última terça-feira (24), em Nova Ipixuna, sul do Pará. O corpo estava a sete quilômetros do assentamento e a cerca de 100 metros da estrada. Ele viu uma moto Bros vermelha sair do assentamento. A mesma moto foi flagrada por outra testemunha entrando no local, minutos antes do crime. Segundo a Comissão Pastoral da Terra, Erenilton também morreu com um tiro na cabeça e a arma seria do mesmo calibre da utilizada na execução do casal de extrativistas Zé Cláudio e Maria.

É lastimável que em alguns lugares do país essa realidade se perpetue. Mesmo em pleno século XXI o ser humano mostra do que é capaz em nome do lucro. Nosso heróis pagam com a vida a defesa de nossa natureza, defendendo também algumas condições mínimas de sobrevivência para estas comunidades pobres e que vivem dos recursos naturais. Mais uma vez a causa ambiental brasileira está de LUTO.

Lembrei de uma canção de León Gieco, músico argentino, compositor e intérprete. Ele escreveu a canção "Solo le pido a Dios", que Beth Carvalho e Mercedes Sosa gravaram e que transcrevo a seguir em nossa lingua pátria. Assim como o compositor argentino, acredito que não podemos e não devemos ficar indiferentes diante dessas mortes.

Eu só peço a Deus
Que a dor não me seja indiferente
Que a morte não me encontre um dia
Solitário sem ter feito o que eu queria

Fica aqui a homenagem a esses nossos heróis que tombam em prol da natureza. Clique e ouça em silêncio.



“Não se pode destruir o que não se pode criar”.
Melquiades Pinto Paiva

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Meu caro Jairo,
paladino das questões ambientais,
repito o que disse em minhas falas desta semana e fiz central na blogada de quinta-feira: “Aos nossos mortos nenhum minuto de silêncio. Mas toda uma vida de lutas.” Este crime deste sábado ratifica a sanha assassina.
Quando te cumprimento pela preciosa reminiscência da luta pela defesa da sustentabilidade do Planeta alio-me a tua indignação e a tua dor.

attico chassot
EM TEMPO: O vídeo é comovente