06 dezembro 2014

DO TAMANHO DO RIO GRANDE

Romera era apresentador de rádio e televisão e
divulgava a tradição gaúcha 
Nesta nossa efêmera existência temos pessoas que passam e outras que marcam nossas vidas. Aquelas que passam, pouco serão lembradas no futuro. Aquelas que marcam, dificilmente serão esquecidas. Aquelas não nos tocam, porque nada tem a ver conosco. Nada há de empatia com elas. Estas, sim, fazem marcas em nós. E deixam “timbradas” em nossa alma as lembranças de suas presenças. Pois nesta semana perdi um amigo que foi destas pessoas que marcou minha existência. E esta perda também me fez lembrar de tios queridos que já perdi: Tio Delmo, meu padrinho e gremista muito amigo, o saudoso Tio Derli e, recentemente, Tio Dácio lá de Viamão.

Houve um tempo em minha vida que estive às voltas com a tradição gaúcha, lá pelos idos da década de 1970. Era a fase da juventude e, por influencia de meus pais, fazia parte de um CTG de Canoas, campeão dos primeiros festivais de folclore estadual. Tudo começou em 1977. Naquele e nos outros dois anos (1978 e 1979) conquistamos o título estadual, o que nos permitiu levar o troféu em definitivo. Essa era a regra para quem o conquistasse por três temporadas.

O 35 CTG foi onde Romera
se tornou conhecido 
Com esta conquista fomos convidados a participar de diversos eventos, tanto na capital quanto no interior do estado, e também em algumas capitais do país. Além da participação anual no Festival de Cinema de Gramado, estivemos na Festa Nacional do Folclore que acontecia no Anhembi em São Paulo.

Aqui em Porto Alegre, apresentamos nossas danças e músicas nas Penhas Crioulas do 35 CTG, uma reunião de cantores, declamadores, dançarinos e sapateadores ali na avenida Ipiranga. E as penhas tinham um apresentador reconhecidamente efusivo e competente. Seu nome? Vilmar Romera.

Recebendo a Medalha do Mérito Farroupilha em 2014
Romera se destacava pelo característico linguajar campeiro, e uma entonação forte no final de suas frases quando chamava os artistas ao palco, o que empolgava o público em geral. Sua voz se tornou a marca dos encontros do 35 CTG. Também foi patrão deste CTG, além de lançar e incentivar inúmeros cantores e conjuntos de música gaúchos. Foi fundador dos “Cavaleiros da Paz”, grupo de cavalarianos que percorre vários países divulgando a cultura gaúcha. No último setembro de sua vida recebeu a Medalha do Mérito Farroupilha, homenagem da Assembleia Legislativa Estadual por serviços relevantes no desenvolvimento econômico, social e cultural do Estado.
   
O Comandante da Cavalgada do Mar 
Depois que me mudei para outros Estados, onde morei desde então, me distanciei do grande apresentador. Num destes acasos da vida, encontrei-o no Parque da Cidade, em Brasília, na Expotchê, feira de produtos da região Sul, que reúne conterrâneos e artistas da música gaúcha. Também por notícias que me chegavam em outras plagas, fiquei sabendo de sua iniciativa sobre a “Cavalgada do Mar”. O percurso inicia em Torres e tem seu epílogo em Dunas Altas, próximo ao Balneário de Quintão.  Bastante contestada, principalmente pelos ambientalistas, o desfile dos cavaleiros pelo litoral teve a sua participação ainda no verão deste 2014, mesmo desafiando a doença que lhe tomava os órgãos sem trégua. Mostrou coragem até o fim. Certamente na cavalgada deste 2015, ficará a saudade do grande comandante.  

Fica aqui a minha homenagem a este personagem da cultura gaúcha, e que foi daquelas pessoas capazes de marcar minha existência. Ao amigo Romera, que agora nos mira lá de cima, fica um trecho da poesia de Colmar Duarte, “Último Ato”:

“A morte chegou de quieto,
com alpargatas barbudas
de tanto campear viventes.
[...]
Estava assim distraído,
quando ela tocou seu ombro.

Quis levantar
mas tombou, soltando a cuia da mão.
A cuia rolou prá longe
deixando um rastro e um som
a morte o deixou caído;

Quebrou a cuia do mate,
sofrenou seu coração.

Quando alguém chegou à porta,
que emoldurava o silêncio
daquele quarto vazio,
acho seu corpo, de borco,
com o rosto contra o chão;
o chão – um tronco de angico,
ele – a casca de uma cigarra,
deixada na mutação.

Morreu tal como vivera,
sem aviso, sem alarde. [...]

O gesto característico de Vilmar Romera
Meu querido Vilmar Romera, que o Patrão Velho te acolha!
A ti eu desejo o mesmo que em tuas palavras finais desejavas aos telespectadores do “Fogo de Chão”, na Ulbra TV, fazendo aquele gesto que se tornou característico desde os tempos do 35 CTG:

“Um abraço do tamanho do Rio Grande!” 

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Meu caro Jairo,
mesmo não tendo teu DNActg, Vilmar Romera está forte no meu imaginário gaúcho.
Por tal permito-me aderir a tua comovente homenagem.
Com espraiada emoção.