13 dezembro 2014

POR DETRÁS DA BELEZA, A PENÚRIA

Desde os primórdios da humanidade a natureza se tornou para o homem uma
A natureza nos proporciona inúmeros
recursos indispensáveis
grande fonte de recursos para sua subsistência. Basta que observemos em nossa volta o quanto estamos impregnados das maravilhas naturais. Da natureza extraímos a madeira para o papel, o minério para os metais, o algodão para os tecidos e os frutos para a sobremesa. Em outra dimensão, o homem moderno se capacitou em trabalhar estes recursos transformando-os em verdadeiras maravilhas. Os móveis que enfeitam nossas casas, os eletrodomésticos que facilitam nossas vidas e os veículos que movimentam toda a população, são “constructos” humanos que fizeram desta sociedade uma das mais avançadas que se tem conhecimento.

Todavia, nestas maravilhas estão depositados alguns recursos indiretos que muitas vezes não percebemos. Em cada etapa de seu processo de fabricação há interferências humanas sob a forma de trabalho, cujas condições e remunerações algumas vezes podem-se considerar vergonhosas e humilhantes.

Poderia aqui sofismar por muitos parágrafos sobre a teoria marxista, bem como, sobre o conceito da “mais-valia” do grande pensador da economia moderna. Mas não é este meu objetivo esta semana. O grande mote desta edição é divulgar uma indústria que absurdamente utiliza os recursos naturais, em prol de uma beleza estética da arquitetura, mas que emprega mão de obra em condições análogas às da escravidão. Falo da indústria do mármore e do granito.
A geomorfologia do Espírito Santo é 
de impressionar os visitantes

No ano de 2010 tive uma oportunidade de visitar, pela primeira vez, o estado do Espírito Santo. Chegando ao aeroporto de Vitória, eu e o Ernani, meu parceiro de consultoria há quase sete anos, apanhamos um veículo na locadora e viajamos até a cidade de Resplendor, no interior mineiro. Lá iriamos executar um trabalho para empresa da região. Como o itinerário nos obrigava a transitar pelo território capixaba, nos deparamos inúmeras vezes com caminhões carregando enormes blocos de pedras. Desconhecedores da matéria, pedimos informação no primeiro restaurante que paramos para almoçar. Diante de nossa tamanha ignorância, um dos garçons nos afirmou categoricamente: “Vocês não sabiam que o Espírito Santo é o maior produtor destas pedras no país?“ E nos olhou como se reconhecesse de imediato nossa estupidez.

O trabalho com pedras decorativas é 
extremamente perigoso e insalubre
A partir de então, me inteirei um pouco mais do assunto, observando que essa atividade econômica resulta em muita lucratividade para quem nela investe, mas pouca rentabilidade traz para os que nela estão empregados. É uma quase fábrica de “miséria humana”. Um setor capaz de reunir extremos da periculosidade e da insalubridade. Ali se faz presente o perigo dos explosivos, no “desmonte de rochas”, assim como, as doenças pulmonares pelo excessivo contato com poeiras minerais. Além disso, outros riscos adicionais se podem constatar: o ruído dos marteletes e martelos rompedores, e as quedas de altura, no acesso aos pontos mais elevados das montanhas de rochas.

Muitos acidentes ocorrem no transporte e 
movimentação de pedras
O processo de recorte das rochas é realizado em máquinas muito perigosas, com grande quantidade de partes móveis expostas, elevando ainda mais os riscos de acidentes. O acabamento das pedras de mármore e granito também exige esforço físico, deveras monótono e repetitivo. Não fosse o bastante, a movimentação destas pedras, no transporte e estocagem, também traz infortúnios aos trabalhadores. Se não houver um cuidado com a utilização de ferramentas específicas, como as “ventosas” e alguns guinchos ou pontes rolantes, que facilitam o manuseio e impedem o deslizamento das pedras, os acidentes são inevitáveis. Prova disso foi o acidente ocorrido há alguns anos, aqui na obra do Barra Shopping da zona sul de Porto Alegre, quando um ajudante foi atingido por uma lâmina de vidro no osso da epiglote, durante a descarga. Desfecho fatal.

A beleza da decoração esconde um
trabalho penoso e mal remunerado
E quando nos deslumbramos com a beleza destas pedras, seja numa residência vistosa, emoldurando uma pia de cozinha, ou numa sede bancária, perfilando os degraus de uma escada imponente, não devemos esquecer a origem deste recurso da natureza, que chegou onde chegou, recortado e lapidado pelas mãos destes trabalhadores.  


Posso dizer que eu também não possuía esse olhar crítico por detrás da beleza das pedras que ornamentam muitas de nossas edificações. Somente após esta experiência revelada, pude me dar conta da extrema penúria que está depositada nestas maravilhas que o homem aprendeu a fabricar há séculos. Todavia, é um segmento que ainda agoniza por melhorias nas condições que impõe aos trabalhadores da atividade. 

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Meu caro Jairo,
Leio tua blogada desde a linda Vitória. Como tu me encanto com a paisagem maravilhosa. Conto um pouco na edição desta segunda-feira.
Não vi, até porque minha estada aqui é apenas na grande Vitória aquilo que com propriedade denuncias. Mais uma vez teu blogue se faz sentinela ou guardião da natureza.
Por tal minha admiração.