17 janeiro 2015

À ESPERA DE UM MILAGRE


O brasileiro Marco Archer no banco dos réus, à espera de um milagre
Quem assiste aos boletins de notícia televisivos costumeiramente, ou tem o hábito de ler o periódico diário da maior rede de comunicação do estado, certamente não se cansa de ver cidadãos clamando: “Eu quero é justiça!” Somos todos vítimas de uma sociedade onde impera a violência, e onde a morosidade da justiça faz com que nos sintamos amordaçados em nosso direito à reparação dos danos causados. Mas nem sempre a pena aplicada em casos de crime é uma forma de se fazer justiça. Que se dirá então se a pena for a “pena de morte”, como ocorre em alguns países.

Esta semana uma notícia vinda de bem longe, prá ser mais específico, vinda do outro lado do mundo, dá conta de que o brasileiro preso e condenado na Indonésia, por crime de tráfico de drogas, será realmente executado neste final de semana. Alheio aos pedidos de clemencia da família, aos apelos de organizações internacionais e até mesmo da presidência brasileira, o governo indonésio vai colocar Marco Archer Cardoso Moreira frente a frente com o pelotão de fuzilamento. Segundo a tradição daquele país, o sentenciado tem algumas escolhas sobre a forma como quer morrer. [Como se isso trouxesse alguma atenuação ou conforto num momento como este]. Marco poderá escolher ainda se quer utilizar uma venda nos olhos e também se quer ficar em pé, sentado ou deitado na hora fatídica. Os jornais locais dão conta de que as autoridades já prepararam o esquadrão de tiro, um clérigo e médicos que participarão da execução. Segundo a Procuradoria da capital, Jacarta, os condenados são avisados com três dias de antecedência para que possam se preparar mentalmente e façam seus derradeiros pedidos.

A Indonésia é um país de belezas raras, mas de justiça inclemente
Alguns poderiam dizer que lá sim, na Indonésia, se faz justiça. Mas, mesmo que isso signifique fazer justiça, sou e sempre serei a favor da vida. Acredito que a verdadeira justiça é aquela que resgata o acusado para pagar e reparar os danos provocados à sociedade. Não é excluindo-o do meio dela que se fará justiça. O que ganha a sociedade com a morte simplesmente? Diriam outros: “Agora, sim! Morto, não poderá continuar sua trajetória criminosa”. Mas na minha concepção, a sociedade perde mais uma força de trabalho, uma força que poderia ser colocada a serviço desta mesma sociedade.

Para mim, numa sociedade que se diz pós-moderna, a simples execução de um condenado sem direito a julgamento, ou até mesmo, de imposição de uma pena que não permita a reflexão pelo mal feito, é um atestado de incompetência geral desta mesma sociedade. Foi o que entendi nalgumas execuções ocorridas em breve tempo passado, com a anuência de nações que se dizem desenvolvidas e defensoras da democracia e da liberdade: o enforcamento de Saddam Hussein, o trucidamento de seus filhos, o ataque ao bunker de Osama Bin Laden, entre outros.
 
A execução de Saddam Hussein
E o que isso modificou? Acabaram-se os ataques terroristas? Não! Basta ver o que aconteceu esta semana na França com os jornalistas do Charlie Hebdo.

Sou contra a pena de morte desde que assisti um debate de dois excepcionais professores na FURB (Universidade Regional de Blumenau) sobre o tema. O debate contemplava essa dualidade: a favor e contra a pena de morte. A favor da sentença se postava um professor da área do Direito daquela instituição. Do outro lado estava o professor Sálvio Muller, eminente filósofo e antropólogo, falecido em 2008. Os dois apresentaram inicialmente suas argumentações, defendendo as respectivas posições, às quais o auditório ouviu atentamente por quase uma hora. Depois veio o debate, mediado pelo reitor da FURB. Foi um momento único em minha vida acadêmica.

Pelotão de Fuzilamento é mais comum em tempos de guerra
Prof. Sálvio Muller
O argumento usado pelo Professor Salvio Muller foi muito convincente e me fez ver com mais clareza o absurdo da pena de morte. Para ele, a pena de morte em nada contribui para a sociedade como punição. Pelo contrário, ela pune a sociedade mais do que o próprio crime cometido. Imaginemos uma família que perde um ente querido por assassinato. Fica ali uma lacuna, um vazio. O preenchimento desta lacuna deveria ser responsabilidade do criminoso, substituindo a vítima no atendimento a todas as necessidades a que submeteu aquela família a partir desta ausência. É isso que a justiça deve fazer, exigir do apenado o cumprimento desta pena. Mas não! Com a pena de morte se pune em dobro. Pune-se a sociedade, que não tem mais como reparar o dano cometido, e pune-se ainda a família do apenado, que perde uma força de trabalho que poderia contribuir na educação e formação de uma família decente; e que, agora, fica a mercê desta mesma sociedade, talvez vivendo às suas custas e gerando cidadãos sem a referência de um pai ou de uma mãe, agora ausentes.

Quanto ao brasileiro condenado na Indonésia, só resta torcer como fazem seus amigos, “à espera de um milagre”.

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Eu caro Jairo,
não aconteceu o milagre.
Somos contra a pena de morte. Abstenho de comwntar a extensão do crime praticado.
Um abraço desde Berlin, capital de um pais que aplicou a pena de morte a milhões apenas por sua etnia.
É dolorosa esta realidade,