29 janeiro 2016

UM SÓ PAÍS, DUAS REALIDADES

Procrastinei inúmeras vezes para escrever este artigo que vai tematizar a edição desta semana do Blog. Sempre me vi tomado de uma certa angustia para tratar deste assunto bastante polêmico. Mas a cada excerto que caia na minha mão para leitura nos últimos tempos, me sentia na obrigação de externar minha opinião. Tomei conhecimento mais amiúde deste assunto, quando há alguns anos atrás ouvi o comentário de uma autoridade da educação: “O Brasil é um país com dois tipos de universitários: aquele das instituições públicas, e o outro das instituições privadas”.

Desde cedo meus pais buscaram qualidade em nossa formação, minha e de meu irmão. Portanto, fomos privilegiados com escolas de ensino básico e médio de linha privada, mesmo que os recursos financeiros fossem escassos. Escola pública só entrou em minha vida nos idos da década de 1970, quando por extrema necessidade fui obrigado a frequentar o colegial numa delas. E a qualidade era razoável, bem diferente da penúria que vivenciamos hoje.

O custo de uma formação superior é bastante oneroso
Depois, não havia recursos suficientes para frequentar um cursinho pré-universitário, coisa imprescindível para quem quisesse ter acesso às graduações mais concorridas na universidade pública. Portanto, me vi na obrigação de sustentar uma instituição particular com prestações verdadeiramente “milionárias”. Os valores estratosféricos nos faziam seguidamente arrazoar uma renuncia ao sacrifício financeiro. Mas se quiséssemos um futuro mais promissor, não havia alternativa. E assim fomos seguindo, verdadeiramente “aos trancos e barrancos”.

Algumas instalações de instituições públicas são
muito mal tratadas
Mas foi há cerca de uns dez anos, quando pude estrear em algumas formações de especialização e extensão, frequentando instituições públicas, que me dei conta de algumas injustiças. E quando falo “algumas”, mesmo correndo o risco de errar por ínfima margem, creio que elas ocorram na ordem de mais de 50%. Ou seja, grande parte dos alunos que frequentam estas instituições, são originários da classe média alta, cujos pais possuem larga possibilidade de arcar integralmente com as formações dos mesmos.

Transitando pelas cercanias dos campi de duas delas, onde inclusive fui aluno especial em algumas graduações, se observam redutos de “patricinhas” e de “mauricinhos” apartados daqueles que ali, sempre a duras penas conseguiram garimpar uma vaga. E o mesmo se dá na sala de aula. Mesmo que considerem preconceituosa esta minha visão, não dá para colocar óculos escuros na observação desta realidade ali estampada. E o pior é que estes cidadãos que possuem condições mais do que suficientes para sustentar uma universidade privada para seus filhos, sequer se propõem a contribuir com a manutenção das instituições de que desfrutam. Ao contrário, sugam-lhe tudo que é possível sem qualquer retribuição.

Salas de aulas são por vezes mal conservadas e
os recursos públicos insuficientes
Se isso é verdade? Vamos só comparar um sanitário de uma instituição pública com o da instituição privada. Num deles o cheiro de urina e os vasos sujos chegam a repugnar quem adentra o espaço. No outro, desinfetante perfumado e bancadas de mármore estilo “shopping”, proporcionam prazer no uso. Incomparável. Por que isso? Porque o primeiro não tem dono. Não é de ninguém. Foi construído pelo dinheiro público e hoje carece de manutenção pela escassez destes mesmos recursos. E aqueles que deveriam se sensibilizar com o estado das coisas, principalmente pelo usufruto, sequer se mobilizam, pois o Estado não lhes impõem nenhuma obrigação

E as salas de aula? Da mesma forma. Num ambiente há carteiras com tampos rachados, cadeiras sem encosto, quadros riscados e pisos estraçalhados. No outro, se observam móveis ergonômicos, salas climatizadas, cortinas e vidros translúcidos entre outros. O primeiro, como eu dizia, é de ninguém. O segundo possui manutenção e conservação.

Só há pouco tempo as classes menos favorecidas tiveram
acesso ao ensino público gratuito
E todas as vezes que surge uma proposta para que estes alunos, depois de formados, restituam a sociedade com a contrapartida na prestação de serviços, nossos políticos fazem vistas grossas, pois não há interesse das elites nesta aprovação.    


Felizmente, o último governo proporcionou mais oportunidades de acesso aos alunos das classes menos privilegiadas. Através das cotas, foi possível democratizar a educação superior. Mesmo assim há algumas distorções, pois aqueles pais que fizeram um grande esforço para proporcionar educação básica de melhor qualidade em escolas particulares, hoje estão tendo de continuar arcando com a formação de seus filhos em universidades privadas, ou assumindo altos encargos, apesar dos financiamentos disponíveis, e para o qual os formandos terão de trabalhar anos a fio.     

O congresso nacional pode mudar esta história de injustiças
Mas também agora, uma luz no fim do túnel parece buscar a reparação deste absurdo da exploração que ocorre na educação superior brasileira, assaz conhecido e pouco comentado. Um projeto do Senado brasileiro (PLS 782/2015) propõe que alunos com renda familiar acima de 30 salários mínimos, passem a pagar pela formação universitária em instituições públicas. Como estes valores contemplam famílias que ocupam uma parcela considerada privilegiada, cabe às classes menos favorecidas, que são a maioria na sociedade do país, fazer pressão aos seus representantes para que a aprovação aconteça em breve espaço de tempo. É hora de reduzir as desigualdades e as injustiças que ainda campeiam o Brasil do novo século.       

2 comentários:

Attico CHASSOT disse...

Meu caríssimo Jairo!
Te leio em Paris, olhando a Biblioteca de uma universidade --pública é claro --. Aqui não existe praticamente ensino particular. Tuas trazidas são muito oportunas. Denuncias injustiças e anuncias sonhos de uma pátria que talvez um dia seja educadora de verdade.
Expectante desse dia.

Attico CHASSOT disse...

Meu caríssimo Jairo!
Leio teus muito pertinentes comentários olhando uma biblioteca de uma universidade em Paris --pública é claro. Aqui quase não existe ensino particular.
Trazes denúncias. Fazes anúncios de sonhos. Talvez um dia tenhamos uma Pátria educadora para todos.
Expectante
Attico chassot
Mestrechassot.blogspot.com