10 fevereiro 2017

O PIOR ANALFABETO



Qual será o pior analfabeto?
Nestas minhas seis décadas de existência, não sei quantas vezes escutei esta frase: “O Brasil é o país do futuro”. E me acreditem, não foram poucas. No trabalho, na escola, nas conversas com amigos, nas discussões acaloradas de campanhas políticas e tudo mais, mesmo despercebidamente, lá vinha ela.

Nas primeiras vezes que a escutei, cria eu que deveria dar razão a quem a pronunciava. E de tantas vezes escutar, me convencia de que estávamos num processo de evolução, e que seria somente uma questão de tempo. Pensava também que deveria evitar um sentimento pessimista, daquelas pessoas que só se lamentam e vivem a reclamar.

O cenário que está posto é fruto das nossas escolhas
E o tempo foi passando. Participei de várias campanhas políticas. Enchi-me de otimismo e de bons presságios a cada pleito. Em alguns defendi peremptoriamente posições radicais, e até perdi amigos por causa disso.

Mas hoje, tenho de reconhecer que cometi muitos erros. Nestas décadas vividas não fui capaz de contribuir com a realidade política que hoje aí está, uma realidade que escancara o quanto fui incompetente nas minhas escolhas. Um Estado falido, quebrado, sem prestar o serviço básico de que o cidadão necessita. Eu não soube discernir o “joio” do “trigo”. Em muitas oportunidades me deixei levar pelo “canto da sereia”, e iludi-me com promessas que nunca foram cumpridas. Outras vezes, troquei o meu voto por favores, cujo preço saiu mais caro do que o que recebi, muito mais caro...  

Então cabe perguntar: Por que não há vagas nos hospitais e postos de saúde? Por que as escolas estão sucateadas e os professores com salários atrasados, ou parcelados? Por que a segurança pública é precária, a reboque de salários ridículos prá quem arrisca a vida? Quando são pagos...

A realidade atual reflete a falência do Estado brasileiro
Isso tudo é o reflexo das minhas escolhas equivocadas... Da minha incompetência na atribuição da mais importante tarefa que cabe ao cidadão, o voto... Não encarei isso a sério como deveria. O dinheiro público arrecadado em impostos altíssimos em tudo que se adquire, e tão necessário para os serviços fundamentais à sociedade, são desviados por quem eu escolhi para me representar. A representação que lhes interessa é a sua própria, da sua família, dos seus chegados. Nós somos os "lacaios do reino", como diz Brecht, e que numa tragédia shakespeariana vez por outra acorda o rei, tal qual nos movimentos de junho de 2013.

Cadê aquele futuro que preconizavam quando eu ainda estudava as primeiras letras no Ensino Primário? Cadê aquele futuro que me prometeram quando ao passar no vestibular achei que iria revolucionar o mundo? Cadê aquele futuro que eu tentei vislumbrar quando minha filha nascia, e eu acreditava que ela poderia quando adulta, ir e vir com segurança? Cadê aquele futuro da minha aposentadoria, que depois de anos e anos de contribuição o valor sequer paga os medicamentos necessários a uma velhice decente? 

O movimento de junho de 2013 repercutiu na classe política, mas se calou..
Será que somente eu errei nas minhas escolhas? Serei eu aquele analfabeto político do Bertolt Brecht, que muitas vezes disse que detestava política? E que política era coisa para quem não tem o que fazer?

Pois bem, se o futuro ainda não chegou prá você também, resta a nós dois ouvir um pouco do saber brechtiano e refletir onde foi que erramos:

"O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais". Bertolt Brecht

Nenhum comentário: