Qual será o pior analfabeto? |
Nestas minhas seis décadas de existência, não
sei quantas vezes escutei esta frase: “O Brasil é o país do futuro”. E me
acreditem, não foram poucas. No trabalho, na escola, nas conversas com
amigos, nas discussões acaloradas de campanhas políticas e tudo mais, mesmo despercebidamente, lá vinha ela.
Nas primeiras vezes que a escutei, cria eu
que deveria dar razão a quem a pronunciava. E de tantas vezes escutar, me
convencia de que estávamos num processo de evolução, e que seria somente uma questão
de tempo. Pensava também que deveria evitar um sentimento pessimista, daquelas
pessoas que só se lamentam e vivem a reclamar.
O cenário que está posto é fruto das nossas escolhas |
E o tempo foi passando. Participei de várias
campanhas políticas. Enchi-me de otimismo e de bons presságios a cada pleito.
Em alguns defendi peremptoriamente posições radicais, e até perdi amigos por causa disso.
Mas hoje, tenho de reconhecer que cometi
muitos erros. Nestas décadas vividas não fui capaz de contribuir com a realidade
política que hoje aí está, uma realidade que escancara o quanto fui incompetente
nas minhas escolhas. Um Estado falido, quebrado, sem prestar o serviço básico de que o cidadão necessita. Eu não soube discernir o “joio” do “trigo”. Em muitas oportunidades
me deixei levar pelo “canto da sereia”, e iludi-me com promessas que nunca foram
cumpridas. Outras vezes, troquei o meu voto por favores, cujo preço saiu mais
caro do que o que recebi, muito mais caro...
Então cabe perguntar: Por que não há vagas
nos hospitais e postos de saúde? Por que as escolas estão sucateadas e os
professores com salários atrasados, ou parcelados? Por que a segurança pública
é precária, a reboque de salários ridículos prá quem arrisca a vida? Quando são
pagos...
Isso tudo é o reflexo das minhas escolhas
equivocadas... Da minha incompetência na atribuição da mais importante tarefa que cabe ao
cidadão, o voto... Não encarei isso a sério como deveria. O dinheiro público arrecadado em impostos altíssimos em tudo que se adquire, e tão necessário para os serviços fundamentais à
sociedade, são desviados por quem eu escolhi para me representar. A representação que lhes interessa é a sua própria, da sua família, dos seus chegados. Nós somos os "lacaios do reino", como diz Brecht, e que numa tragédia shakespeariana vez por outra acorda o rei, tal qual nos movimentos de junho de 2013.
Cadê aquele futuro que preconizavam quando
eu ainda estudava as primeiras letras no Ensino Primário? Cadê aquele futuro
que me prometeram quando ao passar no vestibular achei que iria revolucionar o mundo?
Cadê aquele futuro que eu tentei vislumbrar quando minha filha nascia, e eu
acreditava que ela poderia quando adulta, ir e vir com segurança? Cadê aquele
futuro da minha aposentadoria, que depois de anos e anos de contribuição o
valor sequer paga os medicamentos necessários a uma velhice decente?
O movimento de junho de 2013 repercutiu na classe política, mas se calou.. |
Pois bem, se o futuro ainda não chegou prá
você também, resta a nós dois ouvir um pouco do saber brechtiano e refletir
onde foi que erramos:
"O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais". Bertolt Brecht
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