15 setembro 2012

CONECTADOS E DESBUSSOLADOS



A escola tem perdido o controle sobre os alunos

Nós educadores sabemos o quanto a sala de aula tem se modificado nos últimos tempos. Também sabemos quanto está cada vez mais difícil prender a atenção dos alunos e alunas; e a concorrência do mundo tecnológico não perdoa a Escola. São muitos os artefatos tecnológicos que atraem esses indivíduos e os tornam reféns desta tecnologia, fazendo com que percam cada vez mais o interesse por outras coisas do mundo real.  

É sabido que o conhecimento tecnológico tem importância e contribui para o crescimento intelectual. Mas só isso não basta, pois o mundo real não é feito só disso. Então, uma maioria é tomada de assalto por grande alienação, ou seja, há uma  diminuição da capacidade dos indivíduos em pensar e agir por si próprios.

As tecnologias invadem o espaço da sala de aula inevitavelmente
O que tenho visto constantemente em sala de aula é o uso de smartphones, ipods e ipads. Muitos alunos e alunas se mantem conectados todos as horas do dia, incluindo a sala de aula. E está cada vez mais dificil estabelecer regras no ambiente escolar. Mesmo com a legislaçao que proibe o uso de telefone celular dentro da sala, muitos mantem o artefato atrás dos cadernos  e vivem a receber e enviar mensagens, sem tomar conhecimento da fala do professor. Considero uma grande falta de respeito essa atitude, que cada vez mais foge ao nosso controle. Todos perdem com isso: perde o aluno que nao participa da aula e unicamente se preocupa com as futilidades, perde o professor que acaba se distraindo e comprometendo sua atuação.

Hudson de Araujo Couto, médico do trabalho, doutor em administraçao e coordenador do curso de pós-graduação em Medicina do Trabalho e consultor de empresas, escreve na ediçao da Revista Proteção deste mes artigo tratando do assunto. Enfatiza ele que, da mesma forma que o motorista que atende um telefone celular quando está dirigindo, o aluno que fica conectado em sala de aula, e preocupado em responder as mensagens que chegam, a simultaneidade de tarefas é algo prejudicial ao individuo em qualquer situação. Segundo ele, esta simultaneidade não permite que desenvolvamos de forma eficiente nem uma nem outra tarefa.

Araújo: "Interrompo minha fala"
Diz ele na pagina 72 da Revista Proteçao:

“...estar permanentemente conectado se trata de um vício, talvez o maior vício dos tempos atuais, quase comparavel à dependencia química.  

Não tenho qualquer dúvida quanto às enormes perdas relacioandas a esses processos. E faço o que está no meu limite de autoridade técnica e situacional. Em salas de aula, workshops ou reuniões nas empresas em que presto consultoria, quando percebo que a luzinha do smartphone ou do tablet acende e que o interlocutor ou aluno baixa os olhos, imediatamente interrompo minha fala para que o interlocutor retome o bom senso.”

Por último diz ele ainda, conclamando:

“Engenheiros de Segurança, tenham a coragem de proibir o uso de telefones celulares e smartphones na maioria das situacoes de trabalho, mesmo que isso pareça politicamente incorreto e antiquado. Nao sei se este texto de advertencia irá superar o enorme charme dessas novas tecnologias de comunicaçao, mas nao digam que nao avisei. Procurem na internet relatos de acidentes ocasionados pela simultaneidade ligada ao uso dos smartphones e saibam mais sobre o assunto.”

É claro que dificilmente em sala de aula o uso destes eletronicos simultaneamente com a explanaçao de um conteudo irá se transformar em acidente de trabalho. Mas essa epidemia a cada dia tem invadido a sala de aula de forma arrasadora, mostrando quem está ali para aprender e quem vem em busca tao somente de um certificado. 
Nádia: "O homem hoje está desbussolado"

Mas nao é de hoje que estes artefatos trazem prejuizos aos alunos e alunas. Lembro aqui de um ex-aluno meu,  recém formado, e que recebeu uma oportunidade ímpar como Técnico de Segurança do Trabalho em empresa de atuação nacional. Fazia viagens toda a semana para acompanhar atividades com líquidos inflamáveis por várias regiões do país. Sua tarefa era inspecionar as equipes, chamando a atenção para a obediencia aos preceitos de prevenção por parte dos trabalhadores. Desde a época de sala de aula lembro que não abandonava os fones de ouvido, e foi demitido durante o período de experiência desta grande oportunidade por cair no pecado mortal de não modificar sua atitude. Depois do curso, continuou escravo dos aparatos eletrônicos tecnológicos, até mesmo no trabalho.

Segundo a professora Nádia Laguárdia, da Faculdade de Filosofia e Ciencas Humanas da UFMG, em pesquisa realizada com adolescentes no uso das redes sociais:

“...o que se observa é que os grandes ideais, valores e significados sociais que um dia nortearam a vida das pessoas desapareceram. Alguns autores dizem que o homem hoje está “desbussolado”. As instituições tradicionais, como igrejas e escolas, perderam seu poder e sua capacidade de mediarem o saber e a informação. Todo mundo consegue a informação que quer no Google. Na atualidade, os jovens tem mais dificuldades em construir sua identidade em função da queda dos grandes ideais sociais e da multiplicidade de referências. Isso apresenta duas facetas: de um lado, sugere maior liberdade de opções; por outro, gera angústia, dificuldade em fazer escolhas. A internet tanto pode servir ao apagamento das diferenças individuais, padronizando discursos, imagens e significados, quanto pode servir  às manifestações singulares e criativas, favorecendo a reflexão crítica e o laço social. Infelizmente, minha pesquisa nas redes sociais com adolescentes apontou para o predomínio da primeira situação.”
A internet disponível em muitos lugares

E por este tipo de situação, da mesma forma que a professora Nádia e o Dr. Hudson Araújo, observo que é hora de se adotar uma postura um pouco mais radical na condução destes indivíduos. Mesmo que isso signifique uma certa antipatia por parte dos discentes em relação ao professor. Tenho repensado minha forma de atuar e chego à conclusão que, restringir o uso destes artefatos eletrônicos em sala de aula traz mais benefícios do que prejuízos aos futuros profissionais; pelo menos neste momento.

E não podemos renegar que o presente e o futuro passam pela inevitável utilização cada vez maior desta tecnologia em sala de aula. Eu mesmo, há muito tempo, deixei de utilizar cadernos e apostilas para conduzir minhas aulas. A partir deste ano adotei definitivamente o arquivamento da maioria de meus conteúdos em meio eletrônico, pela facilidade com que se armazena enorme quantidade de dados em um só local.  

Quem sabe aos poucos se possa conduzir alunos e alunas a uma situação de utilizar esta tecnologia fantástica em prol do conhecimento, com maior responsabilidade e eficácia.   

Fontes Consultadas: Revista Proteção - Ediçao de setembro 2012
                                   www.ufmg.br/entrevista - acesso em 22.07.2012  

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Meu caro Jairo,
é de profunda atualidade a blogada desta semana. Li-a na esteira de nossa conversa na quarta-feira.
Surpreendente e preocupante a afirmação do Dr. Hudson: “...estar permanentemente conectado se trata de um vício, talvez o maior vício dos tempos atuais, quase comparavel à dependencia química. Só ele vale a edição.
Obrigado pelo importante alerta
attico chassot