Na década de 1970 o Brasil foi Campeão Mundial de Acidentes de Trabalho |
No ano de 1972 o Brasil foi detentor de um
título muito infeliz para a reputação nacional e para os trabalhadores, “Campeão Mundial de Acidentes de Trabalho”.
Diante desta realidade, o governo militar procurou na legislação uma forma de
amenizar esta tragédia, já que a própria repressão já alertava o mundo
democrático que aqui as coisas não iam bem. Foi quando surgiram as Normas
Regulamentadoras no cenário da segurança do trabalho, através da conhecida Portaria
3.214 de junho de 1978.
Mas até hoje, creiam leitores, nem todos os
trabalhadores são assistidos por esta legislação. Os órgãos públicos prescindem
de uma legislação mais efetiva que proteja os trabalhadores estatutários,
aqueles que não se registram pela Consolidação das Leis do Trabalho, CLT.
Por isso, nesta semana, o Blog do Prof.
Jairo Brasil entrevista Luiz Francisco
Pedroso Lopes, engenheiro de segurança do trabalho do Departamento de
Esgotos Pluviais (DEP) da Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Luiz Francisco
atualmente representa o Estado do Rio Grande do Sul no Grupo de Trabalho (GT) nacional
em Brasília, responsável pela elaboração de um Projeto de Lei federal em prol de uma Gestão
de SST aplicável aos servidores públicos.
A seguir, as respostas do engenheiro Luiz
Francisco para o Blog do Prof. Jairo Brasil.
BLOG
do Prof. Jairo Brasil: Por que as empresas públicas não possuem as mesmas
regras da legislação para atender a saúde e a segurança de seus funcionários,
tal como as empresas privadas, que possuem funcionários em regime CLT e demais
observados pelo item 4.1 da NR 04 que trata do SESMT?
Eng°
Luiz Francisco: Em primeiro lugar, esclarecendo, na Prefeitura Municipal de Porto Alegre (PMPA) têm-se
repartições públicas em regime dito Centralizado, onde o Departamento de Esgotos Pluviais (DEP) está incluído e
sob “subordinação” financeira, da SMF - Secretaria Municipal da Fazenda; Gestão
de Servidores, da SMA - Secretaria Municipal de Administração; da SST, de certa
forma, nosso “SESMT”. É ela que coordena as nossas CSST - Comissão de Saúde e
Segurança no Trabalho, equivalendo às CIPA da NR 5, ou seja, a GSSM-Gerência
em Saúde dos Servidores Municipais, subordinado pela SMS-Secretaria Municipal
da Saúde e tem mais as Autarquias, como o DMAE, o DMLU, as empresas de economia mista, como a CARRIS , a EPTC, sendo que estas possuem o SESMT, pois a maioria
de seus servidores, em mais de 95%, são regidos pela CLT.
Espaço Confinado é realidade constante no DEP |
Concluindo,
as Legislações em SST, vigentes, foram “criadas” para a “proteção” dos trabalhadores de regime CLT. Para estatutários, como eu e para 70% da
totalidade de Servidores da PMPA, inexiste a obrigatoriedade de Gestão em SST. Há
um Decreto-lei Municipal de nº 18158 de 18-01-13, que “obriga” a implantação das CSST em todas as secretarias
ou departamentos, centralizado ou não, na PMPA. Felizmente, hoje, têm-se em torno
de 85% destas CSST implantadas e em funcionamento nas repartições públicas da
PMPA, exceto, nas empresas de economia mista, onde existe obrigatoriamente as
CIPA.
Blog: Como surgiu esta
ideia de buscar caminhos para se criar um Sistema de Gestão em saúde e
segurança aplicáveis aos funcionários estatutários em todos os níveis do Poder
Executivo?
Luiz
Francisco: O que tenho conhecimento, é sobre as CIPAs, que de certa
forma, e com iniciativas de alguns servidores de secretarias, “funcionavam”
mas com pouca divulgação e durabilidade.
Isto entre os anos de 1994 a 1997. No DEP, no primeiro semestre de 1998, a
Direção Geral do departamento solicitou
a um colega que criasse um Grupo de Trabalho e constituísse uma Comissão
Eleitoral para formalização de uma CIPA organizada, legítima e referenciada
pela NR 5.
Servidores Públicos enfrentam riscos no dia a dia de suas atividades nas galerias e esgotos pluviais de Porto Alegre |
Fui
convidado a participar deste GT, e interessei-me pelos resultados das reuniões
e encaminhamentos. Resolvi participar como candidato na 1ª eleição organizada
no DEP, onde 96% dos servidores lotados e com matrícula funcional no
departamento votaram. (na época, havia aprox. 300 Servidores, desses, 35 da
CLT).
Fui o
mais votado e por “acordo” com a Direção, me tornei Presidente da CIPA por este
motivo. O Vice foi indicado pelo Gestor Principal.
Nessa
primeira Gestão, 1998/1999, concentrei-me na organização, nas necessidades e carências e em detectar a
estrutura de que dispúnhamos em matéria de SST. Paralelamente, comecei a perceber
que a NR 5 era direcionada somente aos trabalhadores do regime CLT. Compreendi ainda que na PMPA não havia algum Grupo
de Trabalho ou Comissão em SST, organizada ou com “poder de Gestão”, e que
estendesse sua atuação aos demais servidores. Na segunda Gestão, 1999/2000, fui
reeleito e, já com o trabalho mais organizado nos cientificamos que a NR 5 era impraticável
para nós servidores públicos estatutários. Exemplo? Quem é o nosso Empregador
que deverá indicar o Presidente? Resposta: Todos que pagam impostos na cidade
de POA. Esses são os nossos Empregadores... Seria possível “eles” escolherem o
Presidente da CIPA no DEP, conforme a NR 5?
Neste mesmo período criei
o RICIPA – Regimento Interno da CIPA no DEP, ou seja, uma norma “precursora”
readaptada da NR 5 aos Servidores Estatutários.
No ano de 2000,
depois de dois Seminários da CIPA na PMPA, promovida pelo Governo Municipal,
foi criado e participei do GT dos presidentes ou designados das CIPAs
existentes (havia aproximadamente 14 CIPAs). Nesse GT, com nove indicados,
formalizamos e propusemos ao Governo Municipal um Projeto de Lei instituindo a
CSST-Comissão de Saúde e Segurança do Trabalho. Os representantes do Governo solicitaram
um tempo para “estudar a proposta” e fornecer em breve um retorno.
O
retorno veio posteriormente, mas não sob a forma de Lei Municipal, como
gostaríamos, mas através de Decreto Municipal nº 14725 de 05-11-2004.
Eng. Luiz Francisco participou da Conast em Goiania-GO |
Blog: De que forma você tem participado desta iniciativa inédita
pela criação do Sistema de Gestão em SST para servidores estatutários?
Luiz
Francisco: Como Presidente da CIPA/DEP, no GT no ano de 2000, e
durante este período, participando em GTs Municipais, como Prevencionista Voluntário.
Também como Supervisor de Estágio de alunos dos cursos de Técnico em Segurança do Trabalho. Em 2004, entrei
na Associação Riograndense dos Engenheiros de Segurança (ARES), onde pude
ministrar palestras técnicas, de capacitações em NR 33 – Espaço Confinado. Participei
ativamente no desembargo do DEP em agosto de 2008, provando que a NR33 têm que
ser adaptada às peculiaridades das atividades naquele departamento, que lida
muito nestes locais. Participei também de inúmeros eventos como representantes
da ARES.
Também
por iniciativa própria participei de debates relacionados à Gestão Obrigatória
em SST dos Servidores Públicos de Regime Jurídico Estatutário em Goiania, na
Conferencia Nacional de Segurança e Saude no Trabalho do Serviço Público (1ª
CONAST), ocorrida em dezembro do ano passado. Hoje, sou o representante do RS,
perante o GT Nacional dos Servidores Públicos, que se reúne em Brasília para
discutir o futuro do Sistema de Gestão em SST.
Blog: Em que patamar estão
as negociações com os órgãos governamentais para que isso se torne uma
realidade?
Luiz
Francisco: Na Prefeitura Municipal de Porto Alegre, foi solicitado
indicações de Servidores, de diferentes Secretarias, que atuam em SST, para a
Composição de um GT Municipal para fins de revisão ou propostas de Gestão em
SST, duradoura, baseado nas Legislações existentes. Pelo DEP, serei o
representante.
Em
nível Nacional, após o Evento em Goiania, no qual fui uns dos Painelistas,
apresentando a Gestão CSST na prefeitura de Porto Alegre, a minuta de Projeto
de Lei resultante dos debates e propostas aprovadas nesse evento está em nova
formatação. Na reunião do GT Nacional dos servidores públicos, ocorrida em
Brasília no último dia 13 de fevereiro, decidimos reavaliar e readequar as propostas,
elaborando uma minuta de Projeto de Lei que cria (ou implanta) nacionalmente
uma Gestão Obrigatória em SST aos Servidores Públicos Federais, Estaduais e
Municipais em todo território nacional. Este documento contem diretrizes para
referenciar a implantação em nossas unidades federativas.
Estamos
cientes que as NRs são de grande valia e referência, sem dúvida nenhuma. Mas,
como ocorre aqui em Porto Alegre, tanto a NR 5 quanto a NR 33 devem ser
adaptadas às nossas particularidades. No DEP já adaptamos a NR 33 aos nossos
procedimentos, nos casos de adentramento, permanência e rastreabilidade do
Espaço Confinado e Rede de Esgotos Pluviais ou Mistas. Tenho inclusive um artigo
publicado em meio eletrônico sobre isso (http://www.ppci.com.br/pdf/nr33repm.pdf).
No
início de abril haverá a 2ª Reunião do GT Nacional em Brasília, onde
definiremos e encaminharemos a minuta de Projeto de Lei Federal em Gestão em
SST dos Servidores Públicos e, nesse caso, por extensão a todos do Regime
Jurídico Estatutário. Temos alguns aliados políticos no Senado Federal e na
Câmara dos Deputados. Buscamos convencê-los da importância e dos benefícios
deste projeto de Lei. O GT sabe que é importante ser aprovado em 1ª instância,
numa Audiência Pública e, posteriormente, o convencimento dos demais
parlamentares. Vamos, “democraticamente”, enfrentar essa luta, com Saúde e
Segurança, mas sempre unidos. A hora é agora!
Blog: E quando for criado
este novo sistema, como você acha que ele ocorrerá dentro do serviço público?
Que barreiras você visualiza no futuro, caso isso aconteça?
Luiz
Francisco: Após sua aprovação e passados os “prazos legais de
implantação”, acredito que esse GT Nacional e seus componentes terão de auxiliar,
capacitar através de seminários e palestras. Teremos muito trabalho, e isso é salutar
quando é para o bem do trabalhador servidor público.
Quanto
às possíveis barreiras no caminho do Projeto de Lei, a principal deverá ser
“financeira”. Há necessidade de investimentos em melhorias no ambiente
funcional, juntamente com os gastos em exames médicos periódicos, mudança de
função ou de retorno de Licença Médica (afastamento), sem mencionar ainda os
custos em infraestrutura na informatização do sistema, nos programas comuns a
todos, nos registros de Acidentes de Trabalho e estatísticas diversas
etc....(Isso é só o começo...)
Convencer
gestores em sua administração (quatro anos) da necessidade de investir, e
priorizar a SST, sendo que o retorno destes “investimentos” ocorrerá, possivelmente,
fora de sua Gestão.
A solução
em contornarmos esses “obstáculos” é trabalhar no sentido da persuasão, do
convencimento sempre...
O Conast foi realizado em dezembro de 2013 |
Blog: Implantado o novo
sistema destaque quais serão os maiores benefícios para os trabalhadores da
iniciativa pública.
Luiz
Francisco: Conforme “escrevestes”, os trabalhadores da iniciativa
pública terão dois caminhos a seguir:
a)Sendo
da CLT, cumprir rigorosamente o que determina as Normas Regulamentadoras;
b)Atender
as Legislações Municipais, Estaduais ou Federais, próprias aos Servidores
Estatutários, como a CSST que é o homônimo da NR 5-CIPA.
Blog: Você gostaria de
incluir mais outro tema ou responder alguma pergunta que não foi incluída nesta
entrevista?
Luiz
Francisco: Não, no momento. Vamos priorizar e que o “Pai Maior nos
emana do Alto: força, saúde, perseverança, paciência e sucesso nesta “grande
batalha” que entramos, esperando a vitoriada nossa luta”...
Blog: Deixe uma mensagem
para os estatutários seus colegas e o que eles podem esperar deste esforço que
conta com a sua participação.
Luiz
Francisco: Precisamos ter persistência, paciência, coragem, otimismo, espírito de
grupo, união e buscar de forma constante a melhoria de nossas condutas profissionais.
Principalmente precisamos conscientizar aqueles mais carentes de instrução,
educação ou financeiramente. Necessitamos melhoraro ambiente profissional,
pois, de certa forma “somos privilegiados” em ter esse saber, aliados com a
prática (vivência...).
Mas
seremos julgados pela nossa “própria consciência” e pelo servidor ou trabalhador
mais humilde, se não repassarmos o que temos dessa experiência e que assegure
um ambiente de trabalho saudável e
harmonioso!
Grande
abraço, meu amigo, mestre e prof. Jairo Brasil...
Um comentário:
Prof. Jairo, interessante e importante conteúdo e aprendizagem temos com esta entrevista e alegra-nos saber dessas gestões na busca da aplicação da SST e especialmente das Normas de prevenção também aos servidores públicos não celetistas. Em 1996 fui relator e aprovamos na UFRGS as COSATS - Comissões de Saúde e Ambiente de Trabalho e os CONSSATS - Conselhos de Saúde e Ambiente de Trabalho. Temos nas COSATS todos o membros eleitos, sempre a escolha da legislação mais favorável ao trabalhador, mesmo que internacional, assim como um curso de formação que ministro com cerca de 45 horas aulas, sendo que a último edição foi em novembro-dezembro de 2013. Exercemos cargos de gestão no campo da SST e hoje temos o Departamento de Atenção à Saúde que congrega várias Divisões, todas ligadas a saúde dos servidores e alunos. Já ministramos cursos e palestras para mais de 1000 pessoas ao longo desses anos, na UFRGS e fora dela, levando a idea da participação dos trabalhadores na melhoria das suas condições de trabalho. Implementamos ainda em 2000, quando dirigíamos a área de Segurança do Trabalho, um sistema informatizado de perícias técnicas de insalubridade e periculosidade, dando a esta questão antes meramente pecuniária, um interesse na promoção da saúde e identificação, nas áreas de perícia médica, de possíveis adoecimentos relacionados aos riscos no trabalho. Hoje o Serviço Público Federal trem o SIAS-Sistema Integrado de Atenção à Saúde do Servidor, buscando implementar sistemas e comissões que na UFRGS já implementamos em 1996 oficialmente. Procuramos agora avançar ainda mais com o Mestrado e dentro dessa nova etapa de formação, ofereceremos importante produto social para a qualificação do campo prevencionista não apenas nos serviços públicos, mas para todas as empresas. Aguardemos.
Prof. Gerson Rocha...
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