28 dezembro 2012

DE NOVO CHEGOU O FIM DO ANO



E o ano mais uma vez vai findando, demonstrando que o tempo é implacável com todos nós. Somos adeptos das belezas da juventude eterna, de rejeitar aquelas rugas que aos poucos vão surgindo de maneira implacável, como a nos lembrar que ninguém se livra tão fácil desta sina. Mas, e o que então pode fazer com que o avanço da idade seja recebido de maneira inteligente e motivadora? É possível isso? Mesmo com as marcas que o tempo nos impinge, as rugas, a flacidez e os torcicolos?

Nossa sociedade é intrinsecamente uma sociedade de aparências, onde o maior valor reside nos figurinos de “Apolo”, aqueles moldados em academias e sob o jugo dos “personal trainers”. Aliás, contei aqui tempos atrás sobre uma cidadezinha do interior, onde fiquei hospedado durante dois dias, e que pude ver muita gente malhando na academia, trocando as caminhadas de final de tarde pelo cárcere da modelagem corporal. Fiquei bastante intrigado com aquela realidade, jamais por mim imaginada tempos atrás.

Sêneca viveu no início da Era Cristã
Por isso tudo, aproveito para trazer um pequeno artigo do Professor Antonio Ozaí da Silva, do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá, editor da Revista Espaço Acadêmico e do Blog do Ozaí (http://antoniozai.wordpress.com/). Com frequência acesso este Blog e tenho certa admiração por seus escritos. Neste artigo ele traz algumas considerações sobre o processo de envelhecimento, sob a ótica do escritor e filosofo romano Sêneca, ou Lucius Annaeus Séneca, cuja biografia indica tenha vivido em Roma nos primórdios da Era Cristã.
Espero que gostem do artigo e que nos faça refletir no ocaso de 2012, onde até mesmo o “fim do mundo” foi previsto. Boa leitura!
O jovem almeja viver muito, mas dificilmente se imagina idoso. A juventude parece-lhe eterna e raramente verá no velho diante de si o espelho que reflete a sua imagem futura – isto se tiver a sorte, ou azar, de viver muito, pois a ninguém é garantido atingir a velhice. Os jovens, em geral, sentem-se imortais, a morte parecem-lhes mais apropriada aos que chegaram à terceira idade – recusam-se a pensar na morte e nisto são acompanhados por muitos idosos iludidos com a seqüência do passar dos dias. Alguns até desdenham dos mais velhos – talvez, inconscientemente, seja uma reação de auto-proteção e de recusa do futuro que se anuncia. “Um jovem”, escreve Ernst Bloch, “pode imaginar-se como homem, mas dificilmente como idoso: a manhã aponta para o meio dia, não para a noite. Em si é estranho que o envelhecimento, na medida em que se refere à perda da condição anterior com ou sem razão sentida como mais bela, só comece a ser percebido por volta dos 50anos. Não haveria perda para o jovem que deixa para trás a criança? E não haveria uma perda para o homem quando deixa a florescência da juventude, quando o impulso se atrofia?” [2]
O culto ao físico e à imagem são marcas da nossa sociedade atual
O cinquentenário parece anunciar o movimento de descida. Agora, a vida desce ladeira abaixo. Há o risco de deprimir-se diante da certeza de que a vida esvaece-se a cada dia e a morte parece mais próxima. O otimista reage fazendo de conta que a vida não passou, iludindo-se com o apego à juventude. O dito de que permanecemos jovens em espírito é um engodo. Não há como negar que o tempo passou, as marcas na face, as doenças que irrompem, as dores no corpo, a perda da vitalidade, etc., demonstram-no. “O tempo passa com uma infinita velocidade, e só percebemos bem se olharmos para trás; o passado escapa aos que se absorvem no presente, tal o modo pelo qual essa fuga ocorre sutilmente”, afirma Sêneca. [3]
Não é preciso enganar-se, fazer de conta de que o tempo não passou, nem cair em depressão diante das dificuldades que o avançar da idade impõe. Basta encarar com naturalidade. Começamos a morrer tão logo nascemos, é a dialética da vida. Os jovens não estão isentos do sofrimento e as dores do tempo não são exclusividade dos idosos. “Mas incomoda”, dizes, “ter a morte em vida.” Em primeiro lugar, ela está sempre presente, quer para o velho ou para o jovem – e não se trata aqui de consenso surgido de uma votação. Depois, ninguém é tão velho que não possa reivindicar para si mais um dia. Um dia é um degrau na vida”. [4]
Saber viver e envelhecer é uma arte
O mais importante na vida não é a longevidade, mas o viver bem. Chegar à velhice não significa necessariamente ter vivido mais, pois aquele que a morte abraçou em tenra idade viveu bem se intensamente. “Que importa, afinal de contas, sair antes ou mais tarde de onde se deve mesmo sair? O essencial não é viver por muito tempo, mas viver plenamente”. Pois, de que adianta ao homem, “oitenta anos passados sem ter feito nada? Ele não morreu tarde, mas ficou morrendo por longo tempo. Viveu oitenta anos, mas viveu mesmo? Importa saber a partir de quando se conta sua morte?” [5]
A medida da vida está em olhar para si mesmo e contabilizar não o tempo, mas as ações e as relações humanas construídas. Se olharmos para trás e sentirmos que valeu a pena viver, então a vida foi plena. Por que, então, temer a velhice? A morte não escolhe idade, por que temê-la? “É um homem muito feliz e com plena posse de si mesmo o que espera o amanhã sem inquietude. Todo o que diz “já vivi” recebe cotidianamente mais um dia como lucro”. [6] O amanhã não nos pertence! Portanto, encaremos com alegria ter vivido o que nos foi permitido. Ainda que o tempo imprima marcas indeléveis no corpo e alma que chega aos 50 anos de existência, nos alegremos por cada dia acrescentado ao viver. Afinal, a velhice tem as suas vantagens!
[1] SÊNECA. Aprendendo a viver. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 35-36.
[2] BLOCH, Ernst. O Princípio da Esperança I. Rio de Janeiro: EdUERJ: Contraponto, 2005, p. 43.
[3] SÊNECA. Aprendendo a viver. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 34.
[4] Idem, p. 10.
[5] Idem, p. 91-92.
[6] Idem, p. 11.

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Meu caro Jairo, em 2012 este blogue, em cada uma de suas edições, teve a densidade de 'uma revista semanal crítica. parabens!
chassot