14 dezembro 2013

OS HOMENS DO INTERIOR

Concórdia foi meu primeiro contato com uma cidade interiorana
Posso me considerar um homem nascido e criado em região metropolitana e, por isso, corri o risco de não saber sobre a realidade das cidades interioranas. Ainda bem que, num certo momento de minha vida, ocorreu uma guinada muito grande e tomei contato com aquela realidade.

Próximo dos meus vinte anos fui convidado a conhecer a realidade da cidade do interior. Através de meu amigo Noé de Vargas, coordenador de relações públicas da Sadia na época, fui convidado a trabalhar em Concórdia, no vizinho estado de Santa Catarina. Eu que até então conhecia mais amiúde somente a metrópole gaúcha e as cidades circunvizinhas, pude me acercar de um mundo totalmente diferente, com peculiaridades que jamais imaginei. E quanta riqueza neste contato.

Aos poucos fui me inteirando daquela realidade, e observei que ali habitavam personagens que assumiam papel preponderante na comunidade. Uns desempenhavam papel de mobilizadores, e eram capazes de defende-la em vários momentos. Dentre estes, os mais conhecidos eram o juiz, o delegado e o padre. Mas também havia outros capazes de espreitar oportunidades para se aproveitarem da população, principalmente dos menos instruídos. Nestas questões normalmente estavam presentes os políticos, tanto os candidatos quanto os já eleitos. E todo mundo se conhecia, e também sabia o que cada um seria capaz de fazer “pela” e “contra” a cidade.  

E isso não conheci somente em Concórdia, mas também em outros pequenos recantos onde vivi e trabalhei posteriormente. Foi assim em Blumenau (SC), em Londrina e Rolandia (PR), em Taguatinga e Brazlandia (DF) e em Mandirituba (PR).
Outras cidades do interior fizeram parte de minha realidade

Mas uma das coisas que sempre me chamou a atenção foi o “sermão” da missa dominical, quando o pároco não deixava de aproveitar a comunidade reunida prá passar uma “carraspana” nas personalidades públicas. Ali ele aproveitava para reivindicar e exigir. Ali o padre se tornava porta-voz da comunidade para pedir e denunciar sem constrangimentos, pelo respeito do cargo que a Igreja lhe conferia. Por incrível que pareça, muita coisa ficava conhecida do público da cidade ali na missa de domingo, pelo sermão do padre.

Pois há poucos dias, fui tomado pelas lembranças destes personagens das cidades pequenas. Isso aconteceu porque tomei conhecimento das inúmeras denuncias de corrupção próximas da capital gaúcha, numa cidade que possui as mesmas características daquelas que tive a oportunidade de conhecer tempos atrás. Uma cidade que desconhecia a riqueza antes de lá se instalar um empreendimento de grande porte, habitada por um povo humilde e muito trabalhador. O município de Triunfo é considerado um lugar histórico, onde nasceu Bento Gonçalves e onde está enterrado Jerônimo de Ornelas, colonizador e fundador de Porto Alegre.

Padre Genico é um defensor da comunidade de Triunfo
A pequena e histórica Triunfo só ficou mesmo conhecida economicamente depois da instalação do Pólo Petroquímico no início da década de 1980. E assim, tornou-se o quarto maior PIB do RS. Isso fez com que os recursos de impostos pagos pelo núcleo de empresas ali presentes, abarrotassem os cofres triunfenses. Como seria de se esperar, a classe política se instalou ali como um bando de “abutres”, sedentos pelas quantias generosas de recursos disponíveis a partir de então. Desta forma inaugurou-se um histórico de  administrações municipais “enlameadas” em escândalos de corrupção e abuso do dinheiro público. É assim que surge a história de um padre ali na comunidade.

Padre Genico, como é conhecido, já teve inclusive de deixar a cidade em 2010. Uma denuncia feita pelo repórter da RBS sobre o abuso das diárias de vereadores (utilizadas para viagens de compras em Foz do Iguaçu, e que repercutiu no programa dominical Fantástico da Rede Globo) fez com que o padre recebesse telefonemas de intimidação. Padre Genico destacou na época que: “Triunfo era uma antes da instalação do Pólo Petroquímico, e virou outra depois. Todo mundo depende economicamente da Prefeitura, tem alguém da família empregado ali, ou na Câmara, ou numa escola, ou no Posto de Saúde. Por isso, o medo de enfrentar a corrupção.” Na época destacou também que a Câmara de Vereadores não possuía oposição, dificultando ainda mais a investigação das denúncias de corrupção.

O juiz Ivan Fernando assinou as ordens de prisão
Pois no mesmo rastro do padre Genico, nesta semana que se encerra, o juiz de Triunfo, Ivan Fernando de Medeiros Chaves, não deixou por menos. Antes de se mudar de Triunfo, por causa de uma promoção no serviço público, assinou as ordens de prisão e mandados de busca e apreensão da Operação TR-01, depois que ficou comprovada a existência de uma quadrilha na Prefeitura de Triunfo, com desvio de diárias, fraude em licitações e nepotismo. Isso que Ivan recentemente havia sido responsável pela cassação de dois prefeitos e quatro vereadores. Pois mesmo com o novo processo eleitoral recentemente encerrado, constatou-se novo cartel na prefeitura. Segundo o juiz, em entrevista esta semana para jornais da capital gaúcha: “A corrupção em Triunfo é um processo histórico, com a população refém dessas pessoas. O povo é humilde, pobre e a cidade rica, recebendo muito dinheiro do Pólo Petroquímico. Todavia, não possui UTI e nem saneamento básico. Tem ligação com outra cidade através de balsa, apesar de todo o poder econômico”.

São estas então as vozes da cidade. Pessoas que assumem o papel de cobrar das autoridades melhores condições para a população, denunciar os desmandos locais e defender os menos esclarecidos. Assim conheci diversos personagens nas cidades pequenas por onde passei, e aprendi a valorizar e admirar suas ações.

Um comentário:

Attico CHASSOT disse...

Jairo,
meu caro,
precisamos muitos padre Genicos.
Obrigado por levar-nos ao oeste catarinense e depois à históricoa Bom jesus do Triunfo.
A admiração do
attico chassot